Traduzindo

quarta-feira, dezembro 28, 2011

O DJ do ônibus

Quem costuma utilizar o transporte coletivo público sabe muito bem do que vou falar agora. Sabe, também, que é ali, e bem ali, mesmo, que sociólogos, psicólogos e juristas deveriam estar. Ali, todo o comportamento humano se revela, se rebela e se transforma, cotidianamente. O modus operandi humano está ali, todos os dias, pedindo para ser estudado e revelado. Ali, toda a solidariedade e todo o egoísmo apresentam-se das mais diversas formas.

No coletivo, direitos e deveres não são sempre prática ou teoria, confundem-se bastante. Muita gente acha até que não existe nada disso. A lei é a seguinte: quem chega primeiro, fica sentado. Idosos (as), pessoas com bebê de colo, gestantes e deficientes, ás vezes, e só ás vezes, ganham um lugar. Seu, por direito. A lei do coletivo não está nos livros e todos que ouvem falar dela negam a existência de qualquer lei que possa, um dia, quem sabe, regular as pessoas dentro do coletivo. Resumindo, para alguns, não há lei. Pura selva.

A nova e triste moda é a de ser o DJ do ônibus. A pessoa, homem ou mulher, tanto faz, coloca músicas para tocar no celular ou em algum aparelho portátil de som, no mais alto dos volumes. E ainda fica com aquela cara de “hãm?”. Uma falta de respeito. E não há lei que proíba isso, aqui, em nossas terras alencarinas.

As pessoas não reclamam por puro medo, hoje em dia a coisa não está fácil... Nem ao menos pedir para diminuir o volume... Todos ficam com medo de alguma represália violenta. Eu já tive o azar de estar numa dessas viagens, em pé, no meio de uma disputa de paredões. Três “celulares” brigavam para saber qual era o mais potente. E tome forró, funk e pagode...

Nada contra os ritmos, é mais pela falta de educação mesmo. Um playboy usa a grana para comprar paredão de som para colocar no carro e incomodar as vizinhanças por onde passa. Quem não possui tanta grana incomoda mesmo só com um celular.

De vez em quando eu não acho ruim a presença do DJ, é claro, quando ela toca as minhas preferidas. O motorista de certa linha de ônibus costumava escutar Alpha Blondy, Bob Marley, Cidade Negra e outros, toda manhã, e eu achava o máximo ir para o trabalho escutando reggae.

Espero que nossas autoridades “competentes” possam resolver isso. Bom, mesmo pensando positivamente, a criação de alguma lei e possível multa não acabará com o problema, da mesma forma como acontece no trânsito. É preciso investir de alguma forma, seja com educação, multas ou, pelo menos, distribuindo fones de ouvido da mesma forma como acontece com preservativos no posto de saúde e campanhas ensinando a importância de usá-los...
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terça-feira, dezembro 20, 2011

Um ano

Um ano. Quanta coisa acontece em um ano, não é? Quantas pessoas passam por nossas vidas? Aparecem e somem de repente. Aparecem. Somem. Reaparecem. Por quantas situações nós passamos durante todo esse tempo. Quantas lutas travamos? Quantas lágrimas derramamos e quantos sorrisos distribuímos?

A vida não é fácil, eu sei. O “sistema”, a “selva de pedra”, os invejosos, os maus... Eles estão todos por aí, não podemos negar, mas também não podemos ficar reféns. Não podemos deixar que eles nos dominem, tomem conta de nossas vidas. Somos guerreiros e no dia a dia lutamos pelo pão nosso e pela alegria nossa de cada dia.

Felicidade é estado de espírito, é o momento, é o agora. É comemorar um gol ou uma questão correta na prova. Encontrar um amigo. Ver um filme ou uma peça e não entender nada. É rir de uma piada besta e fazer caretas terríveis só para ganhar um sorriso. Equilibrar a vassoura com um dedo e ficar olhando pras nuvens ou estrelas e admirando o mar.

É o abraço saudoso, quente, apertado. É aquele sorriso largo, vistoso, radiante. Aquele beijo no rosto, carinhoso, e aquele beijo. Ah, aquele beijo. Meu bem, felicidade é estar com você. Sempre. Um ano, um ano dos mais felizes que me recordo. Nunca antes na história dos namoros alguém teve um ano mais feliz.

Antes, quando eu era mais jovem, há mais ou menos um ano, eu costumava pensar que felicidade era sinônimo de passado. Como assim? Você só sabia, só conhecia, depois de já ter passado. “Como eu era feliz naquele tempo!”. Viu? Já passou. E, hoje, eu posso ver o quanto eu estava enganado. Como eu era tolo... Agora eu posso ver o quanto eu sou feliz agora e não tenho medo de dizer: eu sou feliz.

Felicidade não é ficar apenas sorrindo feito um bobo por aí. Também é, mas, vai além. Felicidade é saber que se tem alguém para comemorar as vitórias. E também para pensar em dias melhores depois das derrotas. Fazer planos tornou-se uma atividade bem menos chata. Fazer planos com você, meu amor, faz minha vida cada vez bem melhor. Eu te amo e nem aqui e nem na nossa história há de ter um ponto final
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quinta-feira, dezembro 08, 2011

Eu sou o teu amor

Todo mundo tem um amor. Ou, pelo menos, deveria ter. O teu amor sempre renova as tuas energias. Não deseja só briga, quer carinho, quer amor, muito amor. Teu amor é capaz de te fazer iniciar uma revolução e derrubar uma ditadura só para conseguir um sorriso. Não temos preconceito quanto ao tipo: pode ser amor de mãe, de pai, de filho, de amantes, de irmãos... O importante mesmo é que seja amor.

E o teu amor, bonito, sempre, vai te fornecer tudo que for preciso para tu ser uma pessoa melhor. Vai te dizer, sem medo, teus defeitos e enaltecer tuas qualidades. E vai ter amar ainda mais por tudo isso. Por ter consciência da nossa simples condição humana, vai te admirar ainda mais.

Teu amor vai te fazer chorar e rir como um louco, de amor. Estudos interplanetários mostram que o amor faz dessas coisas e, muito, muito apesar, de nem todos os seres humanos estarem com uma cota boa de amor doado e recebido, ele segue na lista dos sentimentos transformadores.

Se a vingança é um prato que se come frio, o amor é um prato para qualquer hora e qualquer situação. Pode ser na madrugada, no amanhecer ou entardecer, ele não muda. O amor não se vinga, do mesmo jeito que não “paga na mesma moeda”. O amor só paga com amor.

E se o amor sente ciúmes? Sim, pois quem tem um amor, tem medo de perdê-lo. E não existe vergonha nenhuma nisso. Todo mundo tem. Todo mundo sente. Todo mundo sabe que o ciúme deixa a gente meio fora de si. Como se vence o ciúme? Com amor, muito amor.

Os médicos todos deveriam receitar o amor. Tudo bem, não se compra, mas se dá e, assim, se recebe. O amor é como uma árvore, começa com uma semente e requer carinho. Quanto mais tomamos conta, bem maior é a chance dele nascer forte, bonito. O amor se alimenta de sorrisos, lágrimas, olhares e gestos. O amor abraça de corpo inteiro e com vontade de nunca mais largar e proteger de todos os males do mundo.

O teu amor vai te levar pra casa e contar uma história de ninar. Vai cantar pra ti desafinadamente e desenhar pessimamente, com amor. Vai cozinhar coisas maravilhosas e outras tantas tenebrosas. Tudo com muito amor e por amor. Vai ser teu médico, professor e psicólogo. Vai ser um porto seguro, água turbulenta e porto seguro de novo.

Vai te levar ao céu e te fazer colocar os pés no chão de modo seguro para que não se machuque. Vai te deixar viver, errar, aprender, errar de novo, acertar e tudo isso muitas vezes, porque assim é a vida. Vai fazer tudo com amor. Vai se doar e, assim, te amar, te amar e te amar...
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sábado, novembro 05, 2011

Inocência

- Alô? Bom dia...
- Bom dia? Bom dia? Eu fico sabendo da tua vida por outra qualquer e você vem me dizer “bom dia”?

- Alô? Quem fala? A senhora pode se acalmar um pouco? Com quem eu falo?
- E ainda mais essa cara de pau fingindo que não se lembra da minha voz... Você mudou muito, meu caro...

- Selma? Selminha? É você, meu bem?
- Meu bem? Meu bem? Olha, César Augusto Vasconcelos de Araújo Silva e Lemos, o seguinte é esse: que história é essa que você não está mais namorando?

- Ah, é verdade... Notícias ruins voam, não é?
- Não muda de assunto, conta logo tudo.

- É tudo verdade. Depois de quatro anos, ela disse que precisava de um tempo pra pensar mais nela, buscar o outro “eu” dela, conhecer novas pessoas... Escuta, como você ficou sabendo?
- A Raimundinha me contou...

- Ah, entendi, não lembrava que ela era sua vizinha...
- Aposto que você nem lembrava de mim...

- Oi? Como? Pode repetir?
- Continua essa história sem fim...

- Pois é, encontrei com ela hoje cedo, quando fui comprar pão. Ela foi tão legal, sabe? Fez um convite para ir à casa dela hoje à noite, lá pras dez, ver filme na casa dela, jogar vídeo game...
- Ah, César, como você é inocente!

- Inocente? Como assim?
- Não está vendo que ela só quer uma desculpa para te levar para casa? E se aproveitar da tua inocência? Essa conversa de vídeo game nunca deu certo! É pior que massagem e filme com vinho e fondue!

- Selminha, por que está tão invocada?
- Porque eu me preocupo com você! É lógico!

- E por qual razão passou tanto tempo sumida?
- Eu? Sumida? Você que não me procurava mais! Quer dizer, você começou a namorar e esqueceu as amigas, mas tudo bem, deixa pra lá. Como está com a finada?

- Pois é, ela me convidou para ir hoje à tarde para a casa dela, conversar um pouco...
- Conversar? Já vi tudo, hoje o dia não está fácil, essas mulheres estão terríveis. Ela só quer se aproveitar da tua inocência...

- Como assim?
- Oura, tu é um cara maravilhoso, certo? Aí ela te larga e te deixa sofrendo por dias e depois, com desculpas totalmente esfarrapadas e ainda quer receber tudo de volta de mão beijada? Não é assim não, tem que aprender a valorizar!

- Então ela só quer se aproveitar da minha inocência... Poxa vida... E agora, o que eu faço?
- Você não faz nada. Fique em casa que eu vou aí e resolvo tudo.

- Você vai vir aqui? E pra quê?
- Oura, pra me aproveitar da tua inocência antes delas...
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quarta-feira, outubro 26, 2011

Pequeno diálogo sobre o Enem

- Isso não é justo! Não é nem um pouco justo!
- Rapaz, deixar de reclamar e vai procurar a tua sala!

- Eu não consigo me conformar com um negócio desses! Isso tudo é uma grande farsa! Essa prova não prova nada, entende? Não prova nada! Onde já se viu um negócio desses? Pra entrar na Universidade eu preciso fazer prova e provar conhecimentos que profissional nenhum do mundo possui, mas pra ser Presidente do País eu não preciso saber de nada! Isso não é justo!
- Deixa de ser exagerado rapaz!

- Desde quando essa prova representa o quanto nós aprendemos?
- Olha, já está quase na hora...

- Poxa, fala sério! Diz pra mim qual é o dentista que precisa ser bom em História ou Geografia pra tratar dos dentes? Qual contador precisa ser fera em Biologia pra me ajudar na declaração do Imposto de Renda? De que adianta saber sobre os aparelhos sexuais das minhocas, se eu vou trabalhar com arquitetura? E me diz também...
- Meu amigo, deixa de ser revoltado. Eu já entendi...

- É tudo mentira! É uma prova de mentira, uma democracia de mentira... Nós somos enganados o tempo todo! Quem me garante que não vazaram o tema da redação para os filhos dos endinheirados do nosso belo Ordem e Progresso?
- Bom, aí ninguém pode garantir nada...

- Eu quero saber por qual razão não podemos mudar isso tudo? Nós seremos passíveis assim a vida toda?
- Bom, você tem certa razão aí...

- Eu não me conformo em ter que saber coisas que não serão úteis nem na minha profissão, nem na minha vida, nem mesmo servirá para contar aos netinhos!
- Olha, lá está a nossa sala. Anda, vamos entrar...

- Será que ninguém vai fazer nada?
- Vai sim. Nós, por exemplo, vamos fazer a prova agora.

- Será que ninguém vai fazer coro comigo contra toda essa manipulação?
- Rapaz, deixa de grito. Pode aparecer alguém e não te deixar fazer a prova...

- Será que... Opa, espera aí! Será que tem bafômetro antes da prova?
- Meus Deus! Mas será possível? Você ficou louco? Bebeu antes de vir fazer a prova?

- Ah, sabe como é que é, né? Hoje tem Línguas... E todo mundo sabe que meu inglês flui melhor depois de algumas doses...
- ...
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domingo, outubro 16, 2011

Descrição

Quem me conhece sabe o que eu sou capaz de fazer pelos meus amigos. Um exemplo disso é a situação atual. Estou no aeroporto esperando por uma pessoa que eu não conheço para entregar papéis que eu não possuo. Faço este favor ao meu amigo-irmão Saulo Rocha. Ele precisa entregar alguns documentos para oficializar a matrícula em um dos semestres do Mestrado. Uma pessoa virá de Feira de Santana, na Bahia, para receber os papéis, aproveitando que vai passar alguns dias em Fortaleza.

Como não consegui os documentos, decidi ir para encontrar a pessoa e pegar algum telefone de contato. Tudo que eu possuía era uma singela descrição. Ele me disse assim: “Olha, é fácil. Ela é branquinha, mais ou menos da nossa altura, quer dizer, por volta de 1,70m e 1,75m, nem magra, nem gorda, mais ou menos 29, 30 anos e com cabelos pretos na altura dos ombros”. O detalhe principal, segundo ele: “ela tem a maior cara de Mariana, pra combinar com o nome mesmo”. Viu como ficou fácil agora?

Não sei bem se era complô do universo ou a velha Lei de Murphy, mas parece que todas as mulheres com cabelos curtos e na altura dos ombros resolveram desembarcar em Fortaleza. Branquinhas e tudo mais. E enquanto muitos aguardavam com papéis de identificação, eu estava lá sem placa alguma, pois havia saído de casa com pressa. Sem papel e sem nunca ter visto a pessoa, eu ficava o tempo todo contando com a sorte...

A minha sorte é que sempre fui um observador nato. Sempre gostei de ficar observando mesmo, então era só uma questão de esperar que os anos de treino tenham servido para alguma coisa. Depois de meia hora em pé, esperando alguém com “cara de Mariana” e pensando em ter que abordar todas essas mulheres sem parecer um maluco, ela chegou.

Cheguei, perguntei e acertei em cheio. Conversei, peguei número de telefone, fiquei de entregar os documentos na recepção do hotel e agradeci bastante pela ajuda, em nome do meu grande amigo, de capacidade de descrição inigualável, de verdade. Na hora de ir embora, enquanto olhava para os lados, ela ainda me perguntou: “Com tantas moças parecidas comigo, como você conseguiu acertar?”.

- Ah, é porque só você tem cara de Mariana...
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sábado, outubro 08, 2011

Namorar

Eu sei que já escreveram muita coisa sobre isso eu não pretendo revolucionar nada, nem tentar mudar a cabeça de ninguém. Eu vou agora dizer o que pude aprender recentemente. Coisa simples, palavras também, mas com sentimentos tão fortes e profundos que me fazem querer compartilhar tal reflexão.

Esses dias eu comecei a refletir sobre o ato de namorar. Namorar não é só firmar compromisso verbal com alguém, não, vai muito além. Namorar é um estado de espírito. Constante. Delicioso. Namorar é a conquista diária, o flerte, a corte. É tentar conquistar a mesma pessoa cada vez mais. Não é uma guerra, não, é um jogo de amar e ser amado. De querer ser uma pessoa melhor.

Quando começamos a namorar e gostar de alguém, de verdade, a gente fica um pouco menos egoísta. Aquele último biscoito do pacote não é mais tão importante, você prefere vê-la comendo, feliz. O mesmo acontece com aquele lugar na janelinha do táxi, ônibus ou avião. Você nem se importa tanto com essas besteiras. Se a outra pessoa fica feliz, tá tudo bem. Você faz questão de querer o melhor para a namorada, sempre.

Em minhas andanças antes de encontrar com ela, faço tudo para lhe conseguir um sorriso com um presentinho. Pode ser um chocolate, uma flor, um coração feito de papel, um sorriso e um abraço apertado... Muitas vezes tenho vontade de levar um cachorrinho que vi pelo caminho, ou mesmo um neném bem fofo ou um velhinho bem simpático só para dizer: “Olha, amor, que coisa linda!”. Em muitas ocasiões eu fiquei com uma vontade gigantesca de arrancar o fim de tarde só para levar para ela e lhe dar de presente.

No entanto, namorar não é esquecer-se de si, nada disso. É aprender a se valorizar e ser valorizado também. É aprender a gostar de si. E gostar mais ainda de estar com alguém que, só pela simples presença, lhe faz tão bem. Mesmo que não se consiga explicar, porque melhor, e bem melhor, do que ficar tentando explicar tanto sentimento bom é aproveitar ao máximo esse estado de espírito e essa companhia tão boa...
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segunda-feira, setembro 19, 2011

Recorte

Eu sei que já está virando rotina, mas vim pedir desculpas pela ausência. Tempo corrido, memória fraca, acho que estou ficando velho... Brincadeira, deve ser só cansaço ou preguiça, sempre me confundo com os dois. Vim apenas mostrar recortes do dia de hoje e deixar a seguinte mensagem: a poesia está em todo lugar. Sinta-a.
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Entre 8h e 8h03

Gostaram do estilo, do jeito e sorriso. Gostaram, todos os espécimes masculinos apertados dentro do coletivo urbano. Tal qual sardinhas, numa caixinha de fósforo. Ela desceu e foi acompanhada por todos os olhares. E, com certeza, por pensamentos e suspiros mais. O ônibus estava parado por conta de um semáforo. Ela aproveitou a parada para descer do coletivo e já ia caminhando quando tudo aconteceu. O vento, matreiro, tratou de tentar levantar a saia.

Ela, delicadamente, tentou segurá-la com uma mão. Com a outra, fez um gracioso gesto para tirar uma loira mecha de cabelo da frente da face. E sorriu. E todo o sol parecia ter saído do céu e se alojado em sua boca. Como brilhava! O momento não passou em branco por parte da torcida.

- Senhora, não vá embora!
- Senhora, podes ir, mas leve-me contigo!
- Dona, devolve a minha razão e meus pensamentos.
- Moça, por favor, devolva os meus olhos que insistem em te seguir!
- E aproveita e devolve o meu coração, gritou outro, mais afoito.

A moça, tímida, sorria sem jeito e sem saber o que fazer. Ficou de olhos baixos, torcendo para o ônibus seguir. E todos ficaram a admirar a jovem, como se hipnotizados por tanta beleza. O sinal abriu. Desespero.

- Motorista, não toca ainda não.
- Seu motorista, espera mais um pouquinho.
- Meu sinhô, dois reais pra ficar mais um minuto.
- Um pacote de biscoito e uma maçã por mais dois.
- Deixa que eu dirijo, moço, peraí.
- Agüenta aí, seu dirigidor, que um negócio desses a gente só vê no cinema.

E o motorista, indiferente aos apelos emocionados, passou a marcha e se preparou para sair. Desespero. Tristeza. Angústia. Naquele momento, todos aqueles homens sentiram-se como marinheiros partindo de sua cidade natal. E o pior, sem ninguém para dizer adeus...

A mocinha de cabelos cor de trigo apiedou-se e decidiu retribuir tanta admiração. Fez um aceno com a mão, como que dizendo um acanhado tchau. Gritos de alegria! Alívio. Agora sim, tudo estava bem. E o ônibus pôde zarpar naquele rio de asfalto, e todos carregavam dentro de si a certeza de um dia melhor...
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sexta-feira, setembro 02, 2011

Papo maluco, versos brutos

A gente segue na luta
Diária
Se for preciso
A gente chora
A gente ri
A gente canta
E não perde o molejo
Mantém o desejo
Mas se for preciso
A gente até foge
Mas a gente não finge
Ser
O que não somos
E o que nós somos mesmo?
E isso nem importa
O que importa mesmo
É que tudo importa
Mesmo sendo contraditório
Tudo isso agora
E tudo isso depois
Porque importante mesmo é ser feliz
É ser criança e brincar de adulto
E ser adulto e lembrar que um dia foi criança
E tentar ser sincero, não só com os outros
Mas consigo mesmo
Que isso é bom
Pra gente e pra todo mundo
Que nem é o mundo todo
Esse todo mundo
Porque se todos fossem iguais
Todos iriam querer ser diferentes
Não em tudo, não todos
Mas pra quê tem gente com tanto
E outros com tão poucos?
E se eu disser que eu quero mais
Disso tudo e de você?
E se eu disser que eu te amo e
Que vamos passar a vida toda juntos?
E eu tava conversando com todos
E agora eu não consigo parar de pensar em ti
E agora queria dizer, pra todo mundo, de novo
Que não adianta ficar e fingir
É melhor fugir
Evoluir
E admitir derrota
Bem melhor do que passar a vida
Fantasiando
Vivendo lorotas
E assim termino mais um poema
Maluco
Com tantos versos bons perdidos
E esses aqui, largados
Em estado bruto
=]

domingo, agosto 21, 2011

Ser humano, ser humano?

Que bicho é tu, ser humano?
Que devia mesmo trocar de nome
E ser chamado de
Ser mundano

Se eu fosse tu,
Ser humano
Largaria todo o ódio
E viveria só amando

Mas que bicho é tu, ser humano?
Que inventou a escravidão
Enganando todo mundo
E oprimindo teus irmãos?

Que bicho é tu, ser humano?
Que carrega nesse nome, humano
Potencial pra tanta maldade
E, contraditoriamente, tanta bondade?

Não te entendo, ser humano
Inventou as religiões
Pra poder brincar de Deus,
Matou tanto inocente,
Que mesmo até sendo crentes
Não tiveram nem a chance
De um mísero adeus.
A qual deus?

Me explica, ser humano?
Quando inventou a absurda teoria
De que burros são os bichos
E espertos são os humanos?

Não te entendo, ser humano,
Por qual razão não faz como
Os pássaros, cachorros, gatos?
Imitá-los um instante
Que perfeito não seria?
Largar toda essa briga
Por Cor, Tamanho, Ideologia?

Me diz, então, ser humano?
Se eu te desse uma nova chance
Pensaria, em deixar de ser assim
Animal irracional
Responsável pelo próprio fim?

Mas tu é muito engraçado, ser humano?
Inventou a medicina
E também o homicida
Saber pedir por graças
E praticar as desgraças

Bonito, hein, ser humano?
Pra quê inventou a propriedade?
Não seria bem melhor
Vivermos todos em irmandade?

Mas, vem cá, ser humano
Já pensou nos dias que virão?
Ou prefere se contentar
Em ganhar mais um milhão?
E se o mundo acabar
Por causa do teu egoísmo?
Pois já saber vai levar
O planeta ao suicídio

Psiu, ser humano
Em respeito aos bons
Vou te dar uma nova chance
Faz favor pra todos nós
Mais uma vez não me engane

Ser humano
Vamos ficar com as coisas boas
Desse teu nome tão estranho
Tem então como ser
Um pouco mais humano?
=]

segunda-feira, agosto 15, 2011

Quatro anos de viagens!

Tcharam!

Quatro anos!

Quatro anos? Pois é, quem diria...

Eu passei dias pensando em colocar algum texto por aqui, mas tinha que ser um texto bem especial, não podia ser qualquer um não.

Acontece que em algumas coisas a gente não manda, na verdade, eu não mando em quase nada, enfim...

Então, assim, desculpa não ter nenhum texto hoje, mas hoje o dia (que na verdade foi dia 13) é só para agradecimentos.

Quem me conhece sabe o quanto eu gosto de escrever, contar histórias, misturando real e imaginário. (sabem também o quanto eu sou louco pela minha morena, por futebol, livros, família, amigos, praia, serra, rede, comer, dormir, viver...).

Eu gostaria de agradecer todo mundo que sempre aparece por aqui, mesmo sem deixar um comentário, não tem problema.

Eu gostaria de agredecer:

Lorena, Carla e Simone, que eu sempre faço questão de ir lá nos blogs ver as novidades, companheiras de longa data.

Josi e as meninas do Eutímicas, Tamyle, Hilário, Katherine, Michel, Juss, Helena, Day, Leni, Roberta, Rafael, Jéssica e tantos outros, obrigado por compartilharem essas histórias e por aparecerem por aqui vez ou outra. São muito importante, de verdade.

E gosaria de agradecer ao pessoal apenas da leitura mesmo, amor, Yslan, Rafa, Rebecca, Alyne, Diego, Leleu, e tantos outros que vez por outra aparecem por aqui.

Eu gosto muito de escrever e mais ainda de compatilhar minhas besteiras, minhas viagens, sempre na veia =D.

Obrigado por tudo, de coração.
Espero que vocÊs tenham paciência pra continuar comigo por mais um tempo e aguentar minhas viagens =p hehehe.

Até a próxima!

Beijos e abraços!!
=]

domingo, agosto 07, 2011

Classificados

Sem querer acabo descobrindo umas coisas bem diferentes. Talvez possa parecer que fico caçando essas coisas, mas não é verdade. Eu estou lá e elas simplesmente aparecem, juro. Quer dizer, não juro não. Mas vamos para o que interessa.

Esses dias, andei procurando nos classificados alguma casa em Canoa Quebrada para poder alugar para passar o Réveillon. E você pode até dizer: “Réveillon? Ainda estamos em julho!”. Oura, mas as coisas funcionam assim mesmo. Em julho, procuramos e alugamos casa para o final do ano; no final do ano, para o Carnaval; no Carnaval, para a Semana Santa e daí pras férias foi o ano embora. Um ano caçando casas ou quartos nos jornais, isso mesmo. Somos caçadores modernos (muitas vezes caçando empregos).

Como não tinha o costume dessa procura, olhei os classificados quase todo e descobri que estão precisando de alguém para lustrar trilho de trem; para trabalhar como cobaia de vacinas e testando coletes à prova de bala. Bem, nada disso me interessa. Até que, sem querer, assim, por acaso, por um descuido, acabei chegando à eufemística seção de “acompanhantes”.

Fora os anúncios de pessoas descrevendo seus atributos e habilidades, com os tradicionais “para executivos”, “para mulheres casadas” e o novo “flex”, “para homens e mulheres”, vi um anúncio diferente. “Romário, 53 anos, 1,65m. Barriguinha estilo seis meses. Bigode cinza, grande, estilo Mercadante. Dentadura postiça, bem conservada e fixada. Estilo paizão tarado. Somente para mulheres e homens sem barba”. Bacana, né?

E o outro foi: “Emengarda, 47 anos, cabelos loiros, raízes pretas. Siliconada. Silicone no joelho, ouvido e calcanhar esquerdo por conta de ter precisado frear a bicicleta. Barriguinha dividida, oito pneus. Duas hérnias, apenas, e quase curada da asma. Para homens de todas as idades e para mulheres acima dos 47. Não precisa carona, tenho mobilete”. Bem, era só isso mesmo. Besteira, né?
=]

quinta-feira, agosto 04, 2011

Cafas namorando

(“Porque sou feita pro amor da cabeça aos pés”, Ana Carolina falando disfarçadamente do Cafas)

- Cafas!
- Arthurzinho, maxo, já te disse, para com esse negócio de Cafas!

- Opa, foi mal, mas seguinte, parabéns, cara!
- Ah, rapaz, brigadão!

- Muitas felicidades nessa nova fase.
- Poxa vida, eu até tinha esquecido que meu aniversário é hoje. Ei, mas meu aniversário não é hoje não. Parabéns? Como assim?

- Eu já fiquei sabendo, viu? Seu danado!
- Hum, como assim?

- Oura, parabéns por essa vitória que eu sei, não adianta me enganar.
- Poxa, valeu, eu tava querendo isso faz tempo mesmo. Quem te contou, foi minha mãe?

- Não, tava todo mundo sabendo, eu vi na internet.
- Sério? Tá todo mundo sabendo que eu fiquei curado de uma curuba na bun...

- Que curuba o que rapaz! Sai pra lá!
- E que negócio de parabéns é esse? O que eu ganhei mesmo?

- É pelo teu namoro, pelo teu namoro.
- Ah, valeu, mas agora já é tarde.

- Como assim? Tarde como? Eu fiquei sabendo ontem à noite.
- Pois é, ontem eu fiquei tão feliz com o fato de minha garota ter aceitado namorar comigo, que usei o celular para colocar na internet que estava namorando. Pense numa burrada grande, foi o começo do fim...

- O que aconteceu?
- O telefone parecia um pai-de-santo em dia de festa, só recebendo entidade. Rapaz, mas ele não parava de se tremer, parecia que tava tendo era convulsão. Tremia direto. Era ligação ou mensagem chegando direto e a minha namorada só olhando pra mim com a cara mais feia do mundo, e olhe que ela é de uma lindeza que não existe jeito de ficar feia, mas nesse caso era só raiva mesmo...

- E tu não desligou o telefone não?
- Mas é claro que desliguei! Mas não adiantou.

- Como assim?
- Seguinte: estávamos no shopping. Depois de um cinema e um lanche, fiz o pedido e ela aceitou. E foi aí que o diacho do celular começou a tremer feito liquidificador, né? Desliguei mas aí o negócio ficou pior.

- Pior como?
- Rapaz, mas você não vai acreditar. Começou a chegar bilhetinho com recado em guardanapo.

- Mentira!
- Mas rapaz! Não to dizendo? Chegou, sim. E ela ainda leu alguns. “Pedro, você não pode namorar, você é uma força da natureza”. “Pedro, seu egoísta, e nós, como vamos ficar?”. “Pedro, e nossas noites debaixo das goiabeiras?”. “Pedro, e agora? Vou ficar só com o meu marido?”. “Pedrinho, você quer nos deixar viúvas?”. “Pedrito, e nossa tardes de domingo tomando bananada e comendo goiabada?”, “Pedinho, você não é jogo do bicho, mas é paratodos!”. Esse último foi até meio estranho, mas foi isso. E ela leu em voz alta, pra eu escutar.

- E você?
- Eu fiquei todo envergonhado. Eu tava quieto mesmo fazia um tempo, mas aí é aquela história do passado condenar, né?

- Pois é, eu sempre avisava, mas você escutava?
- Pois é. E o pior veio depois. Era a gente passando e umas vendedoras e garçonetes ficavam dando tchau ou piscando. Quando chegamos ao carro, lá estava um recado anotado em uma folha de árvore. Aí foi o fim. Ela disse que não queria morrer de tanto sentir ciúmes e nem passar a vida brigando comigo por conta dessas outras. Eu tentei argumentar, mas não teve jeito. Um namoro de menos de 24 horas.

- E agora, o que você vai fazer?
- Adivinha?

- Já sei, vai voltar para a vida de antes e ...
- Nada disso. Primeiro, eu vou tentar reconquistá-la e mostrar todo meu sentimento por ela. Eu gosto dela e vou lutar, sim senhor! Eu não sou um cafajeste, eu estaaava cafajeste, não é uma coisa para vida inteira. Descobri que o bom mesmo, sem querer ser clichê, é conquistar a mesma garota várias vezes. Vou à luta!

- Se não der certo?
- Bem, aí... Aí tu sabe aquela loirinha que acabou de se mudar e é tua nova vizinha? Pois é...
=]

terça-feira, julho 26, 2011

Querer

Arrá!
Pensaram que tinham se livrado de mim, não é?
Pois é, estou de volta.
Foi mal a ausência, tava numa pesquisa de campo. O objeto da pesquisa?
A vida.
Se alguém tiver sentido minha falta, foi mal.
Espero poder retomar a regularidade.
E vamos que vamos.
Beijos e abraços
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Quando a gente quer, dá um jeito. Ontem eu vi a menina esperar o rapaz terminar de jogar futebol, e isso tudo somente para acompanhá-la até a porta de casa. Vi como ela caminhava o mais próximo possível dele, talvez nem sentisse o cheiro forte do suor. Percebi uma sutil atração entre os corpos e vi o instante no qual ele lhe deu um beijo. E ela saiu, quase flutuando, para casa. Se para o rapaz foi apenas mais uma beijo, para ela, aquele beijo, ah, aquele beijo, foi como a reza antes de dormir. Agora sim podia ir deitar tranqüila.

Eu acredito que quando a gente quer, conseguimos. Aí também não é só uma questão de querer, entra no jogo o esforço, a dedicação. Eu já vi um homem fazer o trabalho de vários, ao salvar tantas crianças como eu nunca pude imaginar.

E já vi mulheres largarem tudo para irem para um país paupérrimo cuidar dos menos favorecidos. Menos favorecidos? Que hipocrisia. Na verdade eles não são nem um pouco favorecidos, são os mais desfavorecidos, isso sim.

Eu acredito que quando a gente quer, corre atrás. Eu vi um homem fugir da seca e tentar ser presidente da República. Mesmo perdendo várias vezes, ele conseguiu, não desistiu. Eu vi o rapaz que tentou o vestibular pra medicina quase uma dezena de vezes, o mesmo que se tornou um dos mais conhecidos cirurgiões-plásticos.

Eu vi cidades e países reconstruídos após as mais diversas tragédias. Eu vi mulheres fortes como somente as mulheres conseguem ser. Eu vi países e povos lutando por independência, e não comprando, como nós fizemos.

Eu vi tanta coisa, mesmo os jornais fazendo questão de divulgar mais as tragédias do que as coisas boas, que continuo a acreditar em dias melhores. E se eu posso fazer alguma coisa para o dia ser melhor para alguém, por qual razão não fazer? Se o máximo que consigo é dizer um bom dia, dar um sorriso ou uma informação, por qual razão não fazer? Se posso ajudar, por qual razão me omitir?
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domingo, junho 26, 2011

Eu e a caranguejeira

Foi uma luta épica, com um clima de tensão, traição, sangue e gritos no meio da noite. Bem, pode ser que tenha sido apenas o clima de tensão, tudo bem, mas se não foi épica, pelo menos será mais uma história para contar aos meus netinhos. Foi uma noite inesquecível. Foi uma noite de espantar medos da infância, de vencer obstáculos inimagináveis e realizar a proteção de pessoas importantes. O que aconteceu? Ah, é, verdade, falta contar. Foi assim...

No silêncio da noite, ela apareceu. Li no texto do L.F. Veríssimo que nós conhecemos um homem diante de duas situações: sob a mira de uma arma e para conquistar uma mulher. Acrescento uma: diante de uma caranguejeira. E essa em particular era enorme, tinha mais ou menos meio metro, em cada perna. Se pulava? Era uma mistura de grilo com canguru...

Eu falei dos dentes enormes? Pois sim, mas de trinta, só na parte de baixo. Como aranha não tem dente? Mas que história! A de ontem tinha e pareciam sedentos por sangue. Parecia uma mistura de tubarão com aranha, uma mutante. Congelei num primeiro momento, ao vê-la. Devia pesar uns cinco quilos, no mínimo. E os seus mais de não sei quantos olhos pareciam raiovosos.

Obtive ajuda, mas isso não é demérito. Minha sogra e meu amor deram-me forças enquanto da vizinhança um nobre guerreiro apresentou-se. Sir Khan Phelo, acho que descendente de Genghis Khan ou do Stallone, mas era um bravo. Bravo mesmo, desses que matavam caranguejeira e dragões antes do café da manhã, só mesmo para poder acordar melhor. “Hoje em dia, só umas baratas e moscas e olhe lá”, confessou depois.

Mostrando toda sua técnica aprendida talvez, quem sabe, em Camelot, desferiu um golpe rápido e certeiro em cima da aracnídea, que não teve tempo de desviar. Rápido e mortal, esse é o veneno da Vespa-d- Mar, não o Sir Khan Phelo, pois a danada continuava vivinha da silva. Escondeu-se por baixo de um carro para poder escapar e recuperar as forças. Ficamos de tocaia um tempo, mas desistimos por um momento. Depois de prestar seus serviços, Sir Khan Phelo partiu, para continuar balançando na cadeira, em nossa calçada vizinha.

Voltamos aos afazeres normais, ainda suspeitando de algum ataque surpresa, covarde. Um pouco de televisão para distrair. O clima de tensão ainda pairava sobre nós. A noite não seria tranquila, mas os acontecimentos precipitaram-se e um novo encontro aconteceu. Era o retorno da caranguejeira, ela voltara para o acerto de contas.

Estava indo embora quando ela apareceu, sedenta por vingança. Escorou no muro, queria me encurralar dentro de casa e não me deixar sair. Tensão. Estava preso dentro de casa? Jamais! “Nunca tomará minha liberdade!”, gritei, emocionado, para ela.

O confronto foi rápido e sangreto. Durou apenas umas duas horas. Ficamos nos encarando, como num filme antigo de faroeste. Até aqueles matinhos passaram rolando, tenho certeza. Depois de um certo respeito mútuo entre nós dois, parti para o ataque certo de que não deveria dar chance alguma. O golpe foi mortal. Estava armado do que pode ser considerado a Excalibur dos pobres e indefesos, um rodo semi-novo. Foi preciso apenas um golpe. Fim da luta.

Decidimos cremá-la, pois deveria ser essa a vontade dela, talvez. Fizemos um ritual de acordo com as tradições de alguns índios, para dizer que ela foi uma oponente com honra. E a noite seguiu tranquila. Contarei aos meus netos, com certeza, antes deles descobrirem que as caranguejeiras não produzem toxinas nocivas aos humanos, ou até mesmo que elas não possuem dentes...
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domingo, junho 19, 2011

Assalto

- E ele mostrou a arma?
- Mostrou.

- E você fez o quê?
- Oura, olhei, né? E me tremi todinho.

- E ele fez o quê?
- Bom, pra resumir, foi assim. Eu tava esperando o ônibus com meu amor. Aí ele desceu do ônibus e pediu dois reais. Não dei e ele mostrou a arma. Pediu emprestado, isso, emprestado, o celular. Tentou ligar e não dava certo. Ofereci ajuda e vi que ele estava ligando a cobrar. Disse assim: pode ligar normal que tem crédito. Aí ele combinou com os outros 39 ladrões onde iriam se encontrar e pediu para avisar ao Ali Bábá que iria atrasar. Agradeceu e ficou olhando para o celular sem entender bem. Comecei a explicar para ele como funcionava tudo. Como tirava foto, usava música, mandava mensagem. De longe parecia até que eu estava vendendo para ele. Começamos a conversar e ele contou ter vindo ou ter sido mandado do Sul Maravilha, Sampa, por estar muito danado por lá. Tentou se aquietar, mas não deu certo. Tinha acabado de vir de um assalto, alguém os dedurou e ele teve de fugir. Pegou o primeiro ônibus que apareceu e nos encontrou.

- E ele tava assim tão tranquilo?
- Até tava, graças a Deus. Acho que só não mais do que eu. Eu tava tão tranquilo que ele chegou a me perguntar se eu era policial. Frieza pura. Controle. E conversamos mais um pouco. Disse para ele ter cuidado com a arma, pois pela área passavam muitos policiais, o que era mentira, porque é mais fácil ver vaca dançando break no asfalto a um policial.

- Nossa. E ele levou só o celular?
- E foi só o celular mesmo, só o aparelho. Enquanto conversávamos, disse que eu poderia levar o chip. Acredito até que se tivesse pedido para ele não levar o celular, ele não teria levado. Quem sabe me dava até o dinheiro do meu ônibus?

- Ah, deixa de ser palhaço!
- Mas esse dia foi tranquilo, da outra vez uma dupla apontou a arma pra gente. Fiquei extremamente indignado! Fizeram meu amor chorar. E ainda nos apontaram uma arma! Uma arma! Enfim, foi uma porcaria, mas deu tudo certo, estamos vivos e felizes e isso é o que importa!

- E como chegamos nesse assunto mesmo?
- Ontem um amigo meu dizia que camburão não era transporte digno para presos.

- E você acha que é?
- Mas rapaz! E bandido tem direito a alguma coisa? Bandido bom é bandido morto!

- O que é isso rapaz? Como assim? Todo mundo merece uma segunda chance! E os direitos humanos? Somos todos irmãos.
- Mas que irmão de bandido o que, rapaz! Tu fala isso porque não foi contigo. Tu acha mesmo que meu irmão faria um negócio desses comigo? Se bem que Caim matou Abel, ou foi o contrário, bem, não importa. Pois sim. É fácil falar quando não se passar pela situação. E esses direitos humanos de direito e de humano não tem nada! Só fica do lado dos bandidos ora... Policial morre e nada dele, aí o bandido morre e vem o direitos humanos. Isso tá errado.

- Mas eles são vítimas! A culpa mesmo é do sistema. Eles não têm oportunidades e acabam indo pro mundo do crime.
- Mas não é assim não, mas que história é essa! Tudo bem, o sistema é do mal, prejudica muita gente, tem muita culpa no cartório, mas não é bem assim não. Se fosse assim, todo pobre era ladrão, e como tem muita gente pobre no nosso país, seríamos uma nação de ladrões! Esses optam pelo caminho mais fácil.

-Você está dizendo besteira, não é fácil roubar ou matar alguém.
- Cara, hoje em dia estão matando pra roubar um celular, uma chinela ou até mesmo nem roubar nada. Não dão o mínimo valor pra vida. Tu acha mesmo mais fácil tentar sustentar uma família com um salário mínimo? Sustentar não sei quantas pessoas com um salário mínimo? Tu acha que é fácil ser honesto e trabalhador num país em que os maus exemplos são maioria? Num país cheio de corruptos que ficam com a maior parte das nossas riquezas?

- Mas eles são vítimas...
- Vítimas somos nós nas mãos desses marginais! E dos políticos também, que não fazem nada! Nada! Eu passo a semana trabalhando, pegando não sei quantos ônibus, fazendo os trabalhos mais diversos, aí vem um cara desses, bota arma na cabeça e ainda chama a gente de vagabundo, vagabundo! Nós? Que passamos a semana trabalhando? É brincadeira...

- Olha, desculpa, mas se você se acalmar e refletir melhor vai ver que não é sensato sair matando bandido por aí que isso não resolve nada. O problema não se resolve assim...
- Certo, perdi a cabeça. Foi-se o tempo da Lei de Talião. Retiro a parte de sair matando bandido por aí, mas é porque é muito revoltante. Eu sei que o problema se resolve com educação, oportunidade de emprego e tudo mais. Certo, eles são vítimas, como nós, desses governantes corruptos. Ao invés de querer acabar com os bandidos com a morte, vamos usar a educação!

- Os dois! Calados! Isso é um assalto! Tirem as coisas do bolso, rápido! E nada de gracinhas, eu não quero ver nenhum herói.
- ...
- ...
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sábado, junho 11, 2011

Conhecer

Engraçado, algumas pessoas possuem uma incrível capacidade de aparecer e conquistarem um espaço, um carinho e confiança como se fossem há tempos conhecidas! São pessoas feito furacão, aparecem e pronto! Como explicamos isso? Não explicamos, apenas aproveitamos a companhia.

Esses dias eu tava pensando na história de que tudo acontece quando tem de acontecer. Um tempo desses, eu tava tão sem dinheiro que quase cheguei a cobrar aluguel dos cravos que habitam meu nariz, pensei até mesmo em vender algumas revistas em quadrinhos e cartões telefônicos, tesouros da infância e adolescência. Hoje em dia já tenho uns trocados para garantir o açaí gelado nos dias de praia, enquanto há tempos ia para lá e levava apenas a grana da passagem. E olhe lá. E continuo com as revistas e cartões (e cravos) e ficaria muito triste se tivesse me desfeito deles (menos dos cravos).

Incluo “no acontece quando tem que acontecer” as pessoas que conheço. Enrolei anos para fazer meu curso de italiano, por exemplo, e hoje já não me imagino sem os amigos que fiz por lá. Alguns amigos aparecem e desaparecem, mas nem por conta disso deixam der ser queridos. Acho muito legal também as “cadeias de amizades”. Uma pessoa conhece outra, amiga, e, depois, o amigo, depois, a amiga e por aí vai... E devo muita coisa a uma certa cadeia de amizades...

Algumas pessoas conversam durante anos em ônibus, trens e lugares outros sem nem mesmo conhecerem o nome uns dos outros. Existe aquela conversa sem objetivo, nem conversa deve ser. Ás vezes são apenas “oi, tudo bem”, “olá”, “bom dia” e nada mais. Outros conversam a vida toda, sabem nome, CPF, quanto calçam e tudo mais, mas não sabem de nada. De nada. Conversas rasas. O legal é que ao mesmo tempo existem pessoas pras as quais a gente se entrega total. Conta todas as alegrias e todos os medos. Confiança. Deve ser esse o nome.

Eu gosto das nossas conversas, pois alternamos sérios assuntos, como crimes, problemas nacionais e a péssima administração municipal, e coisas mais leves, como desenhos que marcaram a infância, dor de barriga, casamento do príncipe inglês e sonhos malucos.

Engraçado que quando tu apareceu, eu não te conhecia. Não? Então por qual motivo eu fiquei extremamente feliz por te ver? Por qual razão eu fiquei triste ao pensar que teu primo era teu namorado? Por que eu fiquei feliz ao te ver voltando ao terem desistido de ir embora? Eu podia até não te conhecer nessa vida, ainda, mas eu tenho certeza: somos amantes desde outras vidas. Namoramos, casamos, tivemos filhos e fomos felizes em outros tempos, outros lugares. E é assim que vai ser agora, como nas outras vidas, ficaremos juntos, prassempre.

Meu amor, o teu sorriso é capaz de fazer o mundo parar de girar só para contemplá-lo junto comigo. O teu sorriso, amor, o teu sorriso, brilha no escuro assim como os teus olhos...
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sexta-feira, maio 27, 2011

Saudade

Bateu saudade
Bateu vontade
De estar contigo
No teu cangote, morena
Bateu desejo
Do teu olhar
Do teu sorriso
Bateu saudade
Bateu vontade
De passar o dia agarrado
De fazer carinho
Fazer versos e poemas
Só pra ti
Minha morena
Ê saudade, bateu vontade
De dançar um reggae
Ou uma polca, um funk ou jazz
Mas deu vontade
De entrançar os dedos
No teu cabelo
De colar teu corpo
No meu
Deu vontade
Bateu saudade
De te fazer navegar
No mar de beijos
E carinhos
Que só eu posso te dar
Deu vontade
Bateu saudade
Do brilho do teu olhar
Da forma como se aconchega
No meu pescoço
Da forma como me beija
E me faz voar
Estando em terra
Deu saudade
Bateu vontade
De te encontrar
Falar baixinho
Ao teu ouvido
Que eu te amo
E que eu te quero
Ca-da-vez-mais
Bateu saudade
Deu vontade
De te carregar nos braços
Casar contigo
Comer chocolate
Com yakisoba
E coca, bem gelada
Deitar na rede
Olhar pro céu
E ver as estrelas
A brilhar
Só pra nós dois
Deu vontade
Bateu saudade
De te fazer rir
Com força
Até a barriga doer
E depois te abraçar
Bem forte
Como se estivesse
A abraçar o mundo
E é mesmo
Meu mundo
Que eu descubro e navego
E exploro
Em cada parte do teu corpo
Em cada olhar
Sorriso
Em cada momento
Que bate saudade
Que dá vontade
E
Deu saudade
bateu vontade
de te beijar
loucamente
com a leveza de uma brisa
com a força de um furacão
deu vontade
bateu saudade
de te e me esquentar
sem cobertor
deu saudade
bateu vontade
de te dizer besteiras
meus sonhos
e medos
e desejos
e que eu sempre vejo no teu sorriso a certeza de dias melhores
pra nós dois
e pro mundo todo
bateu saudade
bateu vontade
bateu vontade
mesmo
de nós dois
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quarta-feira, maio 18, 2011

João Valente

João era um valentão onde morava e onde não morava também. Foi muito famoso antigamente, há muito tempo. Olhando para ele, sentado naquela cadeira de balanço, olhando pro tempo e mascando fumo, ninguém consegue imaginar isso, eu sei. Eu era pequeno quando ele era o maioral daqui. Ele é uma lenda viva, foi uma mistura de Bruce Lee, canja da galinha, Hércules, teimosia de velho, Steven Seagal, uma barra de ferro, Rambo, reza de avó, cheiro de jaca e licor de catuaba, quer dizer, só coisa forte.

Ouvi dizer que ele não teve parto, mas uma luta de estreia. Não apanhou, deu ele mesmo dois tapas no médico, após imobilizá-lo com o cordão umbilical. Foi preciso as enfermeiras ajudarem, e ele só sossegou mesmo quando, por sorte, acertaram a bundinha gorda dele com um calmante. Um lance de sorte ele não nascer com dentes, ou a moça da seringa teria perdido um pedaço do braço.

João era um valentão clássico: olhou pra ele, briga. E moderno: não deu atenção, briga também. Seu cartão de visitas era o bíceps direito, acompanhado do punho direito. E o cartão de saída era o bíceps esquerdo e o punho esquerdo. Sua apresentação incluía golpes com cotovelo, calcanhar, ombro, barriga, uma técnica tailandesa na qual se usa os olhos para atacar e uma técnica israelense secreta que utiliza o nariz para nocautear os adversários. Assim era João, um valentão.

Suas brigas não tinham hora para começar e muito menos para acabar. O problema de um valentão é topar com outro igual, mas para o azar de muitos, não havia igual ao João. Um dia, Pedrão da Conceição apareceu por aqui. Era o valentão da cidade vizinha. Acontece que perto de João ele virou uma flor. Logo, João era o valentão de duas cidades. E foi chegando gente, e foi apanhando gente e gente sendo espancada. Se João soubesse o que é o Universo, poderia pensar em se declarar o maioral do Universo.

E foram surgindo as mais diversas histórias sobre ele. E era tudo verdade, pois, se alguém duvidasse, ele fazia acreditar. Era melhor acreditar e continuar com os dentes do que não acreditar e ficar banguela. O azar de um valentão, mesmo, é encontrar um sujeito diferenciado, calmo, pacato. Desse que não fazem mal a uma flor, a uma abelha qualquer.

João Valente não tinha nado de bonito, mas com tanta força, quem precisa mesmo de beleza, não é? Algumas se jogavam aos pés dele e ele aproveitava cada uma como aproveitava uma fruta qualquer. No São João, deu de cara com Dona Tatá, mulher de Clóvis, único responsável pelo serviço de correios da cidade. João decidiu: ela seria sua mulher. Foi uma luta feia. Durou uns bons segundos. João agarrou Tatá pelo braço para levá-la com ele, Clóvis ficou no meio e levou um empurrão. Levantou e com toda a calma e falta de juízo do mundo, ficou novamente na frente. Tensão no ar.

Então, um golpe certeiro acertou João, bem lá em baixo, onde o homem prefere dar a cara e receber um murro a levar pancada lá. Cortesia de Tatá, valente mulher valente. Clóvis aproveitou a chance e deu um chute em João. Agora, fiquem sabendo que Clóvis trabalhava como carteiro, andava por tudo quanto era lugar. Imagine a força nas pernas. Foi só um chute. E de João Valente voaram toda a valentia excessiva e os dentes...
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sábado, maio 14, 2011

Dor

Eu não queria dizer isso não, mas, infelizmente, ou felizmente, eu tenho alguma experiência com a dor. Calma, não sou daqueles loucos por dor, sado ou masoquista, nem sei como diz. Eu, embora muito novo, em relação ao Sarney eu sou muito novo, já passei por uns maus bocados. E se os machucados da pele sararam, também não levo mágoas no coração e nem mesmo cicatrizes na alma.

Há mais ou menos dois anos, jogando o sagrado futebol das segundas e quartas, “ganhei” um chato problema no joelho. Um amigo muito “habilidoso” tentou passar por mim, dei um toque na bola, ele se desequilibrou e, não me perguntem como, num golpe digno de alguém da família Gracie, aplicou uma tesoura-voadora no meu joelho direito. Foram seis meses longe das quadras, gramados, areias e qualquer espaço mínimo para chutar uma bola. A dor que senti no momento foi a de alguém tentando atravessar uma faca no meu joelho. Uma dor desgraçada, mesmo. Não chorei.

Inventei, mais uma vez no futebol, até hoje não sei a razão, de ir jogar no gol. Goleiro só pode ser doido, só pode. Aí, um coroa muito forte, tipo o Rambo, deu um chute tão forte, mas tão forte, e eu fui tão burro, mas tão burro, que coloquei o braço no meio. Resultado: não quebrou o braço, mas o pulso foi embora. Umas duas semanas de tala, muito gelo e dor. Nem sinal de lágrima.

Quando pequeno, já levei mordida de cachorro e uma vez me esfolei todo numa queda de bicicleta. Por sorte meu avô estava perto e eu queria mostrar ser forte pra ele, além da presença dele sempre me acalmar. Um dia eu até quase perdi o dedão do pé direito ao pisar num resto de árvore. Já levei quedas e pancadas diversas, tudo sem derramar uma lágrima.

Quando pequeno, criança é bicho engraçado, decidi subir no escorregador ao invés de descer. Gênio, né? Toda criança faz isso. Levei uma queda, lasquei o joelho – sempre ele – no chão. Fui pra casa calmamente e dolorosamente para falar com meu pai e irmos ao médico, o joelho estava muito inchado. Eu era gordo, mas aquilo ali não era gordura não. Chegando lá, o médico disse que resolvia num instante. “Vou só ali pegar um negócio e já volto”, disse ele. Voltava com um pratinho e eu, gordinho feliz, pensava que ia ganhar um lanche. Dentro do pratinho, uma seringa, aplicada em meu joelho sem dó e piedade. E eu vi o sangue saindo do meu joelho para o prato. Sem chorar. E ganhando elogios do pai. “Caba maxo”, e eu lá, na frieza de quem tá doido pra chorar, mas não pode perder a pose de valente, fazendo uma pose igual a do Che.

Lembro que quando muito novinho, morando na Bahia, chorava ao ver meu avô saindo de casa. Isso, na verdade eu não lembro, me contaram. Ele só podia sair de casa depois que eu dormisse, senão, não tinha sossego. Chorei uma vez quando o vi doente. Estava bem, mas só o fato dele estar doente, com alguns tubos e frágil, já mexeu muito comigo. Ele sempre foi forte, teimoso e muito ativo.Vê-lo na cama não foi fácil. Graças ao bom Deus ele continua ao meu lado firme e forte e ele há de ver meus filhos cor de café com leite no final da tarde. E vai fazer pães de queijo para eles, paçoca, colocar nos braços, contar histórias e tudo mais. Tenho certeza!

Eu nunca fui muito de chorar não. Já reprovei cadeira da faculdade, levei bomba em provas diversas, não passei em concursos, terminei namoro, perdi coisas, fui roubado, perdi finais de campeonato, vi o timão e a seleção perderem, mas nada disso me fez chorar. E eu até pensava que estava ficando uma pessoa fria, mesmo com toda a sensibilidade e sentimentalidade, pois não conseguia chorar. Ficava todo arrepiado ou mesmo muito triste em algumas situações, mas nada de lágrimas.

Mas meu amor, minha morena, não resisto ao te ver mal, sofrendo, doente ou o que quer que seja, ao menos saber de ti desse jeito. Eu prometi, continuo prometendo e vou mesmo te fazer a mulher mais feliz do mundo durante todas as nossas vidas. E vou mesmo. As tuas lágrimas somam-se às minhas e doem, também aqui, e muito, em meu peito. As tuas lágrimas somam-se às minhas, assim como os teus sorrisos multiplicam os meus. Amor, vamos deixar as lágrimas de lado e voltar aos sorrisos porque nós estamos aqui para sermos felizes. Eu te amo.
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sábado, abril 30, 2011

Experiência

Eu acho legal essa história de experiência, no geral mesmo. E esses dias eu percebi que nem sempre isso significa uma coisa legal. Alguns motoristas, por exemplo, de tão experientes dão-se ao luxo de desrespeitar as leis básicas do trânsito. São tão “bons”, não se preocupam com mais ninguém e acabam trazendo mais problemas ao trânsito em geral.

Experiência é um negócio muito relativo. Você é experiente? Em qual atividade mesmo? Fazendo que coisa? Eu sou experiente no raxa lá do prédio, jogo com pessoal desde criança. E sou inexperiente em alpinismo, nunca escalei monte nenhum, só os de folhas no quintal ou de roupas sujas prestes a irem para a máquina de lavar.

Eu tenho muito experiência também em ser carona, não motorista. E é uma larga experiência. Comecei na barriga da minha mãe, quer dizer, antes, com meu pai, mas sem entrar em detalhes por conta dos mais jovens. Ou então foi a cegonha, né? Deixa pra lá. Passei para o carrinho de bebê, no qual eu inocentemente acreditava ter o controle. Passei por experiência engraçadas, como o carrinho de compras no supermercado, mas eu gostava mesmo era de estar nos braços dos meus avós, nos da mãe e na cacunda do pai. Ali sim eu estava no auge. Passei para os carros, ônibus e táxis e recentemente e lentamente vou passando para a perigosa vida de motorista. Um dia eu vou ter experiência, estou ganhando aos poucos.

Eu gosto de conversar com esse pessoal que tem experiência nos diversos campos. Será que é tudo verdade? E isso importa? Pra mim, não. Pode ser um senhor sobrevivente da Guerra do Paraguai ou uma senhora a contar como atravessou o Mar Vermelho, nem importa, eu gosto é de escutar as histórias. Quem me conhece sabe o quanto eu gosto de conversar, e tão bom quanto conversar com os experientes é conversar com os mais parecidos comigo. Inexperientes. Esse pessoal com muita curiosidade, sede de saber, de conhecer, de aprender por meio de histórias e de perguntas aparentemente inocentes. Eu gosto de conversar com perguntas que contrariam o senso comum.

No entanto,o que me fez pensar sobre a experiência não foi o fato de conversar ou o trânsito, nada disso. Esses dias, lá no trabalho, uma mãe contava da tristeza da filha. “Até faltou o colégio”. O motivo? Acabou-se o namoro. Ela contava entre triste e achando um pouco de graça por não saber como lidar com a situação. Como estávamos todos com os trabalhos adiantados, instalamos inconscientemente uma roda para discutir o assunto, foi quase um Conselho Jedi dos Relacionamentos.

Eu estava entre os mais novos e os conselhos foram variados. “Diz pra ela ir poderosa no outro dia pra ele ver o que perdeu”, “manda ela fazer amizade com o inimigo dele” e outros mais vingativos. Disseram que ela não se preocupasse, pois ainda iria namorar muito, com um amor se esquece outro e o tempo cura. Acho que ela não queria escutar isso. Acredito, inocentemente, que ela não gostaria de escutar tais conselhos, ainda mais, vindos de pessoas, em sua maioria, com mais de 40, 50 e até 60 anos. Conselhos de pessoas diversas, hétero e homoafetivas, velhos, velhas, senhoras solteiras e casadas, jovens separadas, jovens casados, compromissados, enfim, pessoas diversas.

Ela só queria mesmo chorar, tenho certeza, e outra coisa mais que não ousei falar. Limitei, na minha vez no Conselho, a dizer que ela tivesse calma e ver no que pode dar ainda. Tudo tem seu tempo. Embora seja clichê e eu frequentemente repita isso, deve ter um mínimo de verdade. E torcia para que, qualquer que fosse o desdobramento, a jovem ficasse bem.

No outro dia, enquanto todos discutiam a importância do casamento do príncipe inglês para nós brasileiros, a mãe da jovem sofredora contava aos risos. “Pessoal, escuta essa. Ontem eu cheguei em casa e minha filha estava toda alegre falando ao telefone. Estranhei e depois fui conversar com ela”, disse. Alguém consegue adivinhar quem era? Quem disse “é um novo paquerinha” ou “aposto que é o inimigo do carinha lá”, errou.

Era o ex e mais uma vez atual namorado, que havia pedido desculpas e confessando toda a tristeza pelo final do relacionamento e o amor que sentia por ela. E tudo estava bem e os dois jovens ficaram felizes. O pessoal do Conselho estranhou, aposto que estavam torcendo pelo final mesmo “para ela ganhar experiência”.

E namorando quem gostamos e sendo felizes não ganhamos experiência? Duma coisa eu sei, minha torcida secreta para a volta do namoro deu certo. Eu sei, nem sempre é simples assim. Nem sempre volta e é até melhor, vai saber, para os dois. Mas se duas pessoas se gostam e querem estar juntas, eu torço pela união feliz e saudável, contanto que os dois fiquem e se façam bem. Não sei como vai ser a história de amor dos dois jovens, mas esse final feliz me rendeu um sorriso que durou o dia inteiro...
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quinta-feira, abril 14, 2011

Força

Esses dias tu me perguntou se eu era forte, lembra? Eu disse num sussurro que depois te responderia. E agora o faço. Antes de mais nada, um pedido de desculpas pelo sumiço e apresento agora uma das causas. Há duas semanas voltei para a academia, de volta à musculação. Já havia freqüentado a academia durante alguns meses entre 2009 e 2010 por ordens médicas. Ou fazia ou não voltaria a jogar o meu querido futebol. Vamos em frente.

Eu sempre me considerei um grande cronista mental por apenas pensar nas crônicas e nunca as escrever. Sempre tive vontade de escrever sobre o tema academia/musculação, mas nunca a coragem para tanto havia aparecido e agora aproveito o momento. A academia rende estudos antropológicos e psicológicos diversos. Eu não sou estudioso do comportamento humano, apenas mais um entre tantos observadores.

Ali tem gente de todo tipo: marombeiros (as) profissionais, iniciantes, pessoas ali por precisar de alguma atividade física, gente de todo tipo mesmo. Há os loucos pela malhação, por querer levantar cada vez mais peso, os que desejam o corpo “perfeito” - pura estética - e os que seguem ordens médicas, feito eu.

Eu não desejo o corpo do Conan ou do Hulk, nada disso. Sou magro e muito feliz com isso. Já fui gordo e fui feliz e agora me contento com a minha forma. Caso seja possível melhorar alguma coisa, tudo bem, caso não, sem problemas. Eu estou lá mesmo para fortalecer a musculatura do joelho direito e poder voltar tranquilamente ao meu futebol. Aquela barriga sarada e aqueles braços fortes não são meus objetivos. Vou tentar, eu acho, com a minha conhecida “coragem”. Se conseguir pelo menos diminuir a barriga e deixar os braços menos finos, beleza, lucro. No entanto, a força que eu quero e sempre pensei pra minha vida eu ainda não sei se é possível conseguir apenas com a academia.

Pensei bastante em como utilizar essa força toda. Como esse pessoal paga para levantar tanto peso e não faz nem ideia de onde usar essa força? Como se contentar apenas com estética? Bom, não os julgo mal, cada um faz o que quer. No entanto, a minha força não é só pra mim e espero que não seja nunca.

Eu quero mais força para ajudar a levar as comprar para casa, ir deixar o lixo sem sofrer tanto com o peso, ajudar nas mudanças e a empurrar os carros quando preciso, trocar um garrafão de água ou um bujão de gás e para ajudar em alguma possível emergência na qual a força física seja mesmo necessária.

Eu quero ter a força que não se ganha na academia. Força para dar um ombro amigo, para dar uma ajuda a quem precisar, força no sentido da perseverança e espiritualmente falando. Meu amor, eu quero a força para te carregar nos meus braços e não parecer um fracote sem fôlego e força, mesmo tu sendo leve feito uma pluma. Eu quero ser forte para carregar nossos filhos no braço e para te ajudar e me ajudar também em todos os momentos. Sempre. Essa é a força que eu realmente quero.
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domingo, abril 10, 2011

Sobreviventes

Eu não gosto de me meter na política e na economia, mas é porque elas sempre se intrometem na minha vida e aí eu não posso ficar calado. Tudo no mundo se resume à política e à economia. Se não for em 100% dos casos é em mais, tenho certeza. Na verdade, tudo se refere ao grande, imenso e gigantesco ego do ser humano. Vamos ver.

No Brasil, os sujeitos se elegem prometendo mundos e fundos. Depois de eleitos, um grupo de mágicos (e palhaços? Ou somos nós os palhaços?), todos somem, não deixam o menor vestígio. Ganham muito dinheiro, trabalham pouco e olha que coisa ótima (para eles): acertam os aumentos do próprio salário, que não é pouco. Legal, né? Fora os vários tipos de auxílio, auxílio-paletó, auxílio-moradia... Devem ter também até auxílio-amante, mas ética e preocupação com o povo, zero. Alguns têm, eu sei. Sem generalizar. Estou falando da maioria.

Aqui é assim: dinheiro demais para poucos, dinheiro de menos para muitos. A sorte é que ainda tem muita gente boa nesse mundo. Sorte mesmo. O governo é omisso em vários aspectos. Saúde, educação e segurança são temas correntes em toda eleição, mas depois, puf, não temos nada disso. É uma humilhação diária. Escola sem professor, posto de saúde sem médico e ruas sem policiais. Péssimos salários aos que mais trabalham. Transporte público sem qualidade. O Brasil não tem população, tem sobreviventes.

Hoje em dia é mais fácil você conseguir uma arma do que entrar numa escola, faculdade ou conseguir uma consulta num posto médico. Eu fico triste com tudo isso. Nós vivemos uma guerra civil no Brasil. Olhem o número de morto por ano. Não é digno de guerra?

Mas o Brasil é o país abençoado por Deus, sem vulcões, terremotos, furacões... O problema mesmo é o brasileiro. E a solução para isso tudo é o brasileiro. Lá no exterior tem guerra civil acontecendo na África, Revolução de Jasmim, ditadores caindo, terremotos, gente lutando pela separação, etnias se matando... E por trás disso tudo está um conjunto de interesses. Onde tem petróleo? Onde podemos lucrar mais? A luta é apenas por liberdade? Pela população pode ser, mas por alguns grupos, organizações, países, vai saber...

Esses dias um rapaz me enviou um e-mail pedindo para enviar dinheiro aos japoneses. Eu, bastante controlado como sempre fui, respondi que poderia enviar minha solidariedade, minha fé, meus pensamentos positivos. Mas como enviar dinheiro para um país mais rico que o meu enquanto os filhos da minha pátria ainda morrem de fome? Ainda dormem debaixo de uma ponte ou em favelas e terrenos sem a menor condição de vida? Como enviar dinheiro para uma das potências do mundo enquanto tem pai de família sustentando a família com um salário mínimo? Enquanto ainda os nossos bravos lutam diariamente para manter uma vida digna e não cair no mundo do crime? Como mandar dinheiro para fora enquanto ele é terrivelmente mal distribuído aqui dentro?

E ainda esses dias um rapaz entrou numa escola e ... E vão chamar psicólogos, sociólogos, biólogos, antropólogos e todos os outros logos para explicar isso. E não vão conseguir explicar. Hoje mesmo já chegou um e-mail falando do caso e colocando Deus no meio. O problema tem várias vertentes para analisarmos, mas falaram de religião e eu não pude deixar de pensar: a religião faz muitíssimo bem para muitas pessoas, faz mesmo, mas por conta de uns poucos as religiões podem acabar destruindo o mundo. As religiões deveriam ensinar em seus mandamentos, dogmas, ou seja lá o que for, a respeitar as outras religiões. Se a pessoa quer acreditar em Deus, Zeus, Odin, Apolo, Tupã, Osíris, Gaia, não importa. Cada um tem o direito de acreditar no que quiser.

Quando eu estudava no colégio ainda, ouvi muito falar na aldeia global e pensei que isso ia significar o fim de muita coisa ruim. Acesso aos serviços básicos, trabalho para todos, condições de vida digna, respeito. Principalmente isso, respeito. Se você analisar as guerras todas e muitas das desgraças do mundo, tudo vai acabar na política e na economia, quer dizer, no grande, gigantesco e imenso ego do homem. O mesmo que está destruindo o planeta. Será que meus netos conhecerão florestas e tantos animais apenas por fotos?

Eu deixo o meu parabéns e meu muito obrigado para todos que lutam contra tudo isso que está aí, Contra toda essa sujeira e covardia de irmão contra irmão, de uns com tantos e outros com tão pouco. E também um orgulhoso parabéns para todos os sebreviventes. Vocês são fortes. Demais.

Ah, aposto ainda que não acabam com as drogas por render dinheiro para alguém, assim como todo o crime organizado. Não se fiscaliza ninguém por estarem com rabo preso. Trânsito, escolas, serviços de saúde e coisas outras não melhoram por qual razão? Esse dinheiro todo do crescimento do PIB há vários anos está indo pra onde? O ser humano ainda vai acabar com o mundo, feito um parasita acaba com sua vítima. O antídoto? O próprio ser humano. No entanto, não sei se já percebeu isso e se vai perceber a tempo... Eu não gosto de me meter na política e na economia, mas é porque elas sempre se intrometem na minha vida e aí eu não posso ficar calado.

quarta-feira, março 30, 2011

Maluco

E aÊ, pessoal, beleza?
Peço desculpas pelo sumiço.
Só pra dizer que vai tudo indo bem e que no final de semana eu apareço pra fazer aquela boa leitura nos blogs amigos.

Beijos e abraços!

As diferenças entre um “maluco beleza” e uma pessoa racional, a meu ver, são tênues. Esses dias eu tive o aumento dessa certeza. Eu já sou tido como meio maluco por ficar reparando em coisas “sem grande importância” para muita gente. Que importância tem o riso da criança, o desabrochar da rosa e o movimento das nuvens no céu? Ou a troca de olhares no ônibus lotado, a gentileza em ajudar a velhinha com as compras e aquele beijo apaixonado e de perder o fôlego, às pressas, antes de partir? Bem, cada louco com sua mania, não é? Eu sigo com a minha de reparar nessas coisas...

Pois bem, vou deixar de enrolar e contar logo o acontecido. Esses dias, depois de uma noite mal dormida, liguei para o meu amor e pronto: todo o cansaço havia desaparecido. Estava o mais forte dos homens novamente. Estava no escritório da empresa, saí um instante, fiz a ligação, conversei e voltei para a sala. Eu vinha tão feliz, tão feliz mesmo, que eu acho que minha positividade mudou toda a sala.

O escritório havia se transformado completamente. Nada de mesas, cadeiras e computadores. Não, nada disso. Ao entrar na sala cantarolando “every little thing is gonna be alright”, do Bob Marley, reparei na mágica, encantadora e aprazível mudança. Ali estava um bosque em miniatura. Um pequeno riacho, grama, árvores baixas, pedras e troncos para sentarmos. Um cheiro de flores do campo e de vida impregnava a sala, ao invés do cheiro de carpete novo, café e cigarro.

As mulheres tornaram-se fadas, pássaros e rosas. Misturavam-se e embelezavam todo o ambiente. Os companheiros da luta diária transformaram-se em gnomos, coelhos e bardos, a declamar versos ao amor e à vida. E todos ficavam em seu lugar e misturavam-se de vez em quando, só para deixar o clima de fraternidade melhor. E tava tudo tão bom que eu tive vontade de sair para te encontrar, porque eu gosto de fantasia, mas gosto mais ainda da minha realidade.

Levaria comigo aquela grande Lua cheia amarrada em um balão. E ela seria só tua e de mais ninguém (peço desculpas aos outros casais e aos lobisomens, mas como o texto é meu, posso pegar a Lua sem problemas). Amarraria ali na tua janela pra tu ter as mais belas noites. No caminho, arrastaria comigo todas as estrelas para colocar no teto do quarto e aos teus pés. Levaria no bolso um pouco dos ventos marítimos e o barulho das ondas batendo na areia, só para deixar tua noite ainda mais refrescante.

Guardaria o sol em uma caixa de música, junto com pássaros de gostosa cantaria. Só abriria a caixinha quando tu acordasse, pois esse é o momento que o dia começa. E ficaria difícil levantar, pois roubaria algumas nuvens para tu usar como travesseiro e colocaria ao teus pés aquela areia branca e fina as praias desertas.

Correria mais rápido que o vento para te encontrar e derrubaria todos os muros e exércitos que ousassem ficar em meu caminho. Eu até aprenderei a nadar para passar por todos os mares, rios e lagos.

E eu te encontraria e seria tão bom, bonito e gostoso que eu nem vou descrever que é pra não largar o texto no meio e sair correndo para te encontrar de verdade. Vou nem dizer mais nada que é pra não dar mais vontade de ti. E eu tenho certeza de que tu ainda teria coragem de me chamar de sem juízo, de louco, afoito, sem noção e maluco, não é? Se tivesse, não negaria. Sou mesmo. Sou louco, maluco por ti.

=]

domingo, março 20, 2011

Tchau

Feliz da vida ia para casa, numa noite dessas qualquer, de lua bonita e céu mais estrelado feito não sei dizer. Mesmo triste por ser obrigado a me desgarrar da minha morena, ia feliz pelo tempo passado junto (muito ótimo, por sinal). Ia tranquilo por um dos nossos humilhantes coletivos. Estava sozinho na parte traseira do coletivo quando subiram um homem e uma mulher e me obrigaram a passar. E fizeram isso com um tipo de violência diferente.

Ele, coitado, não sei se por falta de banho e desleixo mesmo ou por estar voltando da luta diária, do trabalho de onde tira o sustento, soltava um cheiro azedíssimo pelo ar. A moça usava um perfume ou brilho tão doce, tão enjoento, que eu não entendia como a própria suportava. Agora, imagine a mistura desses dois odores. Como estava recebendo a mistura diretamente, decidi atravessar a roleta/catraca e ir sentar lá pela frente.

Observava o movimento, tanto interno quanto externo. As pessoas e carros a passarem lá fora, as idéias e sensações a rodopiarem aqui dentro da cabeça. Estava distraído quando um desses acontecimentos que mudam a vida da gente aconteceu. Não, o ônibus não bateu, não teve assalto e nem ele quebrou. Uma senhora subiu pela porta da frente e sem mais nem menos colocou uma criança na minha cadeira. “Cuida dela pra mim?”, e teria como eu dizer não?

Não sabe ela que mal sei tomar conta de mim, imagine de mim e de uma criança dentro de um coletivo. Naquela hora, eu me senti o responsável pela vida dela, não só presente, mas futura também. Eu já disse como era a criança? Uma menininha, uma doçura, de vestido branco, cabelos castanhos, gordinhas bochechas, olhos curiosos e pele branquinha a segurar um simples balão rosa. E me olhava sem nada entender. Fiquei com medo dela não querer a minha proteção e começar a chorar, mas não chorou.

Tentei um diálogo – eu sou ótimo em diálogos – para estabelecer algum contato. Ela respondia num dialeto incompreensível para mim. “Gliboxiu, absthui, shala-la-la”, devo até ter dito isso alguma vez na vida, mas já não mais entendia, se é que entendia naqueles tempos de criança. Talvez minha mãe entendesse, pensei em ligar para ela e pedir uma tradução simultânea, mas desisti.

E pensei em um milhão de coisas para contar para a pequena: cuidado com os homens, mulheres, em todos os sentidos possíveis, crianças e velhos; tanto tem gente boa como ruim nesse mundo. Memoriza isso. Mas eu gostaria mesmo que ela entendesse a seguinte mensagem: pequena, aproveita bem a tua infância, adolescência, maturidade e velhice. Quando for velha, vais poder olhar pra trás e dizer: “Vivi bem demais, fiz muita coisa, conheci muitas pessoas e lugares e, principalmente, fui feliz”.

Eu até entendo o fato dela não entender nenhuma das minhas palavras e nem fiquei triste por isso. Ela me olhava e olhava, inclinava a cabeça para um lado, abraçava o balão, colocava-o na boca e eu tenho a certeza, quase certeza mesmo, de tê-la visto balançando a cabeça afirmativamente. Minha missão estava cumprida, ninguém poderia dizer que ela não teve instrução quando criança, fiz minha parte. A mãe voltou e a tomou de mim. Desci do ônibus como se faltasse alguma coisa. Pela janela, ainda pude ver a pequena a colocar o balão na boca e quase choro ao ver aquela mãozinha branca acenar um singelo tchau para mim...
=]

sábado, março 12, 2011

Sábado bom

Antes de mais nada, gostaria de agradecer os comentários carinhosos.

Muito obrigado, obrigado mesmo.

Saúde e paz para todos nós.

Beijos e abraços

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Sábado é um dia interessante para dormir um pouco mais, depoimento de uma pessoa que passa a semana acordando cedo. No entanto, se eu passar muito tempo dormindo fico com a sensação de ter perdido alguma coisa, tempo, eu acho, sei lá. Dia desses, um sábado, saí de casa com um objetivo certo: comprar livros num charmoso (ou nem tanto) sebo lá no Centro da cidade. Na verdade, mentira, iria mesmo era me encontrar com minha morena e aproveitaria para antes dar uma passada lá no sebo e caçar alguns bons exemplares.

Dito isso, fiz tudo como o planejado e quem me conhece sabe como sou péssimo em planos. Não consegui sair de casa no horário planejado, mas deu tudo certo. Cheguei ao sebo e a minha primeira vontade foi a de sair abraçando as estantes e sair correndo com elas para casa. Calma, não tenho essa obsessão criminosa, é só paixão pelos livros mesmo. Um dia desses, eu junto dinheiro o suficiente para fazer essa loucura.

Dentro do recinto, mais parecia perdido numa caverna do tesouro, olhava para todos os lados, maravilhado. Indeciso como sempre fui, passeava pelas estantes recheadas de livros novos, velhos, usados, estragados, tirados do lixo, mais ou menos e tantos outros adjetivos. Nem precisa contar do cheiro, né? Cheiro de muita história, tanto nos livros quanto nas dedicatórias, carinhosas, mas perdidas agora.

Com uma enorme felicidade consegui quatro livros interessantíssimos. A pátria em chuteiras, do Nelson Rodrigues; Ed Morte e outras histórias, do Luís Fernando Veríssimo; e dois outros sobre futebol. Saí de lá feliz da vida, como se tivesse encontrado o pote de ouro no final do arco-íris.

A partir daí, abraçado com o saco de livros como se protegesse um saco de livros, foram só conflitos. Ao atravessar um corredor de bebedouros deixados na calçada por uma das milhares de lojas do Centro, o primeiro embate. Em uma ponta, nosso herói, eu, claro. Na outra, uma senhora toda vestida de preto com um mortal guarda-chuva. Para mim, mais parecia o Darth Vader. Nos olhamos durante alguns segundos, só um poderia passar, mas quem iria ceder?

Mais parecíamos um touro e um elegante toureiro. Não preciso dizer que era o toureiro, preciso? Pois bem. Com um rápido movimento, usei minha arma mortal: minha simpatia. Fiz uma reverência como se fazia antigamente, nos tempos da educação ou cavalheirismo, cruzando uma perna por trás da outra e inclinando-me um pouco. Ganhei um sorriso e com tal pagamento a deixei passar.

O segundo combate foi mais agressivo, com mais energia, do jeito que o brasileiro gosta. Ao atravessar a avenida, dei de cara com meu próximo adversário. Um coroa, meio fora de forma, de camiseta e carregando alguns pacotes. Tinha aquela calvície central, estilo ninho de passarinho e utilizava um bigode branco, sempre na moda. Havia uma calçada para nós dois, mas apenas uma reta. Era eu ou ele.

E naquele momento, as pessoas não se deram conta, mas ali a alma do povo brasileiro se revelava. Eu podia ouvir os gritos da multidão a me incentivar, como se estivesse num grande estádio. Ele foi para um lado, eu fui também. Gingou pro outro, fui junto. Bom zagueiro como sempre fui, acompanhava todos os movimentos. Ele tentou mais uma vez e cansou. Chegava a minha hora. Ginguei para os dois lados usando toda a minha malemolência, ele ficou confuso. Numa fração de segundos, que pareceu ter durado toda a eternidade contida em alguns segundos, nos encaramos. Quando comecei a levantar as duas sobrancelhas ao mesmo tempo, como quem diz “e aí, ainda vai encarar a minha marcação mesmo?”, ele começou a rir e me deixou passar. Ninguém aplaudiu ou mesmo reparou nisso, mas foi uma importante vitória para minha carreira de jogador.

Sábado, o relógio marcava 12h30. Em um braço, carregava meu tesouro de livros, com o outro, abraçava meu verdadeiro tesouro, minha morena, a dar leves cheiros e beijos em meu pescoço. Se a metade do dia estava boa desse jeito, eu já começava a rir só de imaginar o que ainda viria a acontecer...
=]

quarta-feira, março 02, 2011

Café com leite

E aê, pessoal, beleza?
Bom, não sei se alguém reparou, mas o marcador da crônica acabou de passar do 100.

Acho que um dia eu comemoro isso, ou talvez não, vai saber.

Acho melhor comemorar logo agora.

Um muito obrigado pra todo mundo que vez por outro vem aqui dar uma espiada nas minhas viagens, que tira uns minutinhos do dia pra viajar junto comigo.

Muito obrigado mesmo.

Esses dias eu tava preocupado, achando que nem tinha mais condições de pensar nessas coisas, olha aí a minha viagem hehehe.

E vamos que vamos.

Beijos e abraços!
=]


Era uma vez uma garota de belos e longos cabelos e grandes, brilhantes e curiosos olhos. Em sua mente, o mundo era sempre diferente: as nuvens, por exemplo, todo dia brincavam de modelagem, um dia, faziam pôneis e dragões medievais, noutro, uma luta de aliens contra o Papai Noel. Sua imaginação não possuía limites e seu interesse em descobrir os segredos do mundo era de um crescimento constante.

A infância foi bastante feliz. Foram brincadeiras com os primos e primas, corridas, brigas, conciliações (porque criança não passa muito tempo “de mal”), banhos no açude e todas as coisas boas que só quem passou por uma cidade interiorana tem a oportunidade de conhecer. Começou a ser chamada por tios e tias de pretinha, por conta da pele morena, cor aguçada pelos prolongados tempos em que ficava brincando debaixo daquele sol de rachar.

Pretinha cresceu, ficou moça. Estudou e se divertiu bastante. Conheceu muitas pessoas, muitos lugares diferentes. Mais parecia uma princesa de conto de fadas, pois só lá tanta beleza poderia existir. Moça, não era “mulherzinha”, valente feito Rosa Palmeirão e romântica como Brigite Jones, alternava tais comportamentos.

Ao garoto branquelo de olhos pequeninos e alegres, com um sorriso maior que o corpo magro, aquilo não fazia a menor diferença. Não a conhecia mesmo. Estava com outras preocupações. Sempre pensou demais, tanto em coisas boas quanto besteiras. Quando viajava de carro, achava que sempre estava sendo seguido pela lua. Gostava de viajar sempre na janela, imaginando-se correndo do lado de fora, pulando os mais diversos obstáculos das calçadas. Hoje, viaja muito, principalmente parado.

Sempre foi muito sonhador e, por vezes, muitas, costumava sonhar acordado. Antes mesmo de algum acontecimento ele já imaginava mil situações e diálogos. Era ansioso por histórias, era ansioso pela vida e seus múltiplos desdobramentos. Não sabia nada disso. Era apenas mais um dentre tantos ansiosos. Ficava nervoso, por conta da grande timidez. Era louco pelo mar, mesmo sem saber nadar. Sempre passava tempos jogando futebol na praia com os irmãos, pai e tios. Voltava mais vermelho que um tomate. De tanto falarem pra ele tomar cuidado com o sol, por ser muito branquinho, esse ficou sendo seu apelido.

Branquinho cresceu, ficou rapaz. Se antes era gordinho e fofo feito uma bola de neve, agora era magro e igualmente branco, mas continuava um fofo, segundo algumas tias. Estudou e se divertiu bastante. Conheceu o delírio, conheceu os loucos e confundiu-se com eles, conheceu os tristes, os animados, os quietos, os danados e confundiu-se com todos eles. A sua cara de bom rapaz sempre o permitiu de tudo. Era feito lobo em pele de cordeiro, embora menos fofo que um cordeiro e menos danado que um lobo. Foi triste e foi feliz em tempos diversos. Era metido a escrever uns versos e fazia pose de alma rebelde, sem essa de se apaixonar apenas por uma mulher.

Branquinho conheceu Pretinha. Os olhos grandes encararam os pequenos. E, juntos, brilharam como fogos de réveillon na praia. Todo o passado dos dois, serviu de base para. As duas histórias, agora, andam de mãos dadas. Eles costumam ser Loucura e Razão, alternando-se nisso. Dessa mistura gostosa nasceram dois garotos e uma garota, todos morenos feito café com leite no final da tarde. E a vida dos dois, embora pudesse passar por momentos azedos, era sempre cada vez mais doce e serena...
=]

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

Amigos, irmãos

Meus amigos, essa semana me deu uma saudade danada de vocês. Por onde andam? Eu entendo de algumas distâncias, de estudos, de trabalhos. Mesmo longe, os sinto aqui perto de mim, sempre lembrando os bons momentos e imaginando novas aventuras. Não somos mais crianças, certo, mas não podemos sonhar e lutar por dias melhores? E as coisas não andam ruim para nós não.

Por onde andas, Saulo? Quais novas e loucas aventuras tu tens para me contar? Tua alma delirante de poeta e artista ainda pulsa forte e tua alegria ainda contagia os demais? Teus raciocínios e drinks malucos ainda viram a cabeça dos conhecidos e desconhecidos? As mulheres ainda te enlouquecem e se enlouquecem contigo? Esses dias eu jurei ter te visto em um dos ônibus da nossa Fortaleza. Tive vontade de furar a lataria com os dedos para parar o coletivo e te dar um forte abraço. Seria mais fácil dar o sinal e esperar que ele parasse? Podia ser, mas o que seria de nós sem o drama e a loucura?

E tu, Yslan, o que fazes agora? Qual cruzeta ou armação espera por ti e quais companheiros do duro ofício realmente são boas companhias pra ti? Tua forte personalidade e a tua noção de amizade sem preço ainda intriga os demais? A tua vontade de não abandonar os amigos ainda inspira outros corações? O chato mais querido de todos, como costumam dizer, ainda é o nosso chato, o nosso amigo de todas as horas.

O que aprontas, Leleu? Tu, que não é mais das moças, que largou todos os corações para ser de uma só, que me contas? A tua independência, forte personalidade e vontade de sempre ajudar os amigos ainda guiam teu coração como sempre guiou? Tu, meu amigo e irmão há mais de vinte anos, quais aventuras dessa vida de estudante e trabalhador tens para me contar? De quais infortúnios tem se livrado com a tua sinceridade sem tamanho?

Faguim, me diz, o que mais tem para contar? Tu, sempre com um repertório de histórias e causos para dar e vender, para fazer inveja aos criadores das mil e uma noites. Com quem andas se envolvendo? Quem anda apaixonando? Quais histórias trágicas e românticas e de aventuras tens para me contar? Tu, mais atualizado de todos nós, sempre por dentro de assuntos astronômicos, gastronômicos, econômicos e tantos outros ômicos, me diz, boas novas. Tu, idiota, como carinhosamente és chamado e também nos chama.

E você, endiabrado Alisson, quais as novas? Quantos tu tens ajudado com os teus conhecimentos médicos? Sabes precisar o número dos que tem ajudado com a tua alegria e maluquices únicas? Com esse teu jeito de fazer graça de tudo, de transformar tudo numa coisa engraçada e depois falar com uma seriedade única. Tu, que mesmo saído do nosso ninho, nosso paraíso perdido, não corta os laços, não se afasta. Quais loucuras tu tens aprontado por aí, quais mulheres tens enlouquecido e quantos e quantos amigos tens conquistado por aí? Tu és um dos nossos, sempre.

As pessoas às vezes até confundem, acham que meus amigos são apenas amigos, que engano. Também costumam achar que meus irmãos são apenas irmãos. Não, são meus amigos também e se enquadram na categoria dos melhores. Cada um com seu jeito único, meus irmãos (dois e uma) de sangue e de vida têm seu espaço consagrado no meu coração. Para não dizer ainda de outros amigos de casa, como pai, mãe e minha morena (amo vocês). E isso, para não falar dos tantos outros distantes. Mas hoje, vamos ficar apenas com os cinco lá de cima.

Meus amigos, meus irmãos. Criados juntos, infância única, incrível. Bons e saudosos tempos. Nossas aventuras não terminarão nunca. Meus irmãos, de diabruras, benevolências, de bons atos e malvadezas, de correrias, de brincadeiras, praias, cinemas, serras, mulheres e sagrado futebol. Meus amigos, meus irmãos, podem ter certeza que mesmo afastados uns dos outros, estamos sempre prontos para uma ajuda qualquer, seja qual for. Estamos aqui, juntos. E somos, com toda a certeza, amigos-irmãos.
=]

domingo, fevereiro 20, 2011

Dia de chuva, dia de sol

A minha terra tem desses mistérios. Aqui, no meu Ceará, especificamente falando de Fortaleza, é possível que depois de uma forte chuva, ou um bom “toró”, como se costuma dizer, o sol apareça. Tem muitos casos de dias e mais dias de chuva também, sem nada de sol, como vem acontecendo nos últimos dias. E nesses dias, a minha vontade é uma rede e minha morena (ê, morena, que saudades doce).

Pois bem, esses dias, esperando pelo “humilhante coletivo”, como costuma dizer um amigo meu, presenciei um desses momentos de transição chuva-sol. Antes, um senhor, senhor mesmo, andava tranquilo, com um saquinho de pão, sem guarda-chuva, debaixo de uns bons pingos d’água. O céu estava cinzento e a água caia sem parar desde a noite anterior. O homem nem se abalava, e a importância daqueles pães para aquele senhor ou para sua família, quem sabe, acho que nunca saberei. Dava pra ver que os pãezinhos estavam bem quentes, pois vinham realmente fumaçando.

A parte mais legal, para encurtar a história e não ficar dando uma de chato, foi a hora da transição do céu nublado para o céu ensolarado. Fiquei a observar o céu com uma curiosidade mais poética do que científica. Pra mim, imaginei uma grande mão puxando uma linha de nuvem, como se desfizesse aquele gigantesco crochê cinzento, deixando para nossa alegria apenas aquele azul forte e mais vivo do que muita gente por aí.

A parte mais triste foi que parecia não haver mais ninguém reparando nisso. Todo esse espetáculo acontecendo em frente aos nossos olhos, como tantos belíssimos finais de tardes, presenciados em outros momentos, verdadeiras pinturas em pleno céu aberto ao alcance de todos, e só eu observando. Pudera, prefiro acreditar que, hoje, foi apenas pelo fato de todos terem conseguido pegar o coletivo e só eu ter ficado, olhando para o céu feito besta... Quem será mesmo que saiu perdendo nessa história? Vai saber...
=]

sexta-feira, fevereiro 11, 2011

Prassempre

Ei, vem cá
Chega mais perto
Deixa eu sussurrar
Ao teu ouvido
O que não mais é segredo
E faço questão de espalhar
Te amo
Entende?

Talvez ninguém nunca
Entenda
Esse meu mais novo e louco
Poema

Nunca gostei assim
De alguém
E nunca mais quero gostar assim
De ninguém

Não me avisaram que o amor era assim
Sentimento bom que parece não ter fim

Conheci, não fosse por ti, não conheceria
Estaria perdido, sem amor, paz ou calmaria

Eu gosto do nosso jogo de paz e amor
De intensidade, de desejos, de sabor...

Hoje em dia, me perder, só em teus olhos
Teu corpo

Vontade de passar o dia agarrado contigo
Na cama ou no balanço da rede

Vontade de passar o dia te beijando
Te enchendo de carinho, te amando

Não me disseram que ficaria, assim, tão maravilhado
Quero dizer que sou por ti, tresloucadamente apaixonado

Eu quase consigo andar sem tocar no chão
Ao saber que mais momentos ótimos ainda virão

E não quero saber da diferença entre amor e paixão, pois
Contigo, ao mesmo tempo, experimento os dois

Nossa união transcende, só faz aumentar
Meu coração, podes ter certeza, é o teu lar

Ainda vou contar todos os meus defeitos
E piores segredos
Vou te contar tudo
Confiante e sem medo
E se ainda assim me amares
Prometo de te amar prassempre
Lu Colares

Tudo que eu quero nessa vida
É te fazer feliz, verdadeiramente
E pra mim, essa felicidade,
de verdade
Só presta se for no plural
Pra gente
Vamos caminhar lado a lado
Prassempre
=]

sábado, fevereiro 05, 2011

Jorginho

Jorginho nunca fez nada de mais na vida. O dia mais importante para ele, talvez, foi o dia de seu nascimento. E quem sabe, pois ele mesmo não lembra de nada disso. Depois daí, não tem tido muito consciência da vida, do futuro. Ele agora está com oito anos, mas já viveu mais do que muita gente. Tem experiência e experiências que parecem únicas, mas são comuns a muitos dos garotos moradores de rua. Conhece muito da vida e talvez nem tanto do mundo. Ou quem sabe, o inverso. Já viu muita gente boa e muita gente ruim. Infelizmente, mais pessoas ruins, embora tenha consciência das pessoas boas espalhadas por esse mundo tão grande.

Esses dias, perambulava pelas ruas de um bairro novo. Com ele, apenas um calção azul, assim como o céu, e a vontade de viver. Correu com os cachorros, chutou poças d’água, bagunçou folhas em quintais e espalhou lixo por aí. Estava alegre, conseguiu uns trocados pedindo em um sinal, um ponto zerinho em folha, e agora tinha dinheiro para comprar um pão. Um pão. Caminhando pelas ruas enquanto mastigava calmamente, deparou-se com uma loja de animais. Parou em frente às inúmeras gaiolas. Começou a observar.

Olhou para os cachorros presos, cachorros assim como os que corriam com ele há pouco tempo. Filhotes, loucos para sair dali e correr por aí como ele faz. Olhou para os pássaros presos e começou a pensar na maldade de se manter um bicho com asas preso. “Se eu pudesse voar, nunca que ficaria preso. Sou mais morrer”. Com todo o infinito céu para ganhar, como manter um animal desses enjaulado?

Olhou para o coelho de grandes orelhas e olhos vermelhos e ficou a se perguntar: “que olhos mais vermelhos! Será que tá doente ou fumou um?”, e começou a rir. “Com essas orelhas, dá pra escutar os ‘homi’ chegando de longe”. Era criança, mas já conhecia muita coisa da vida e dos homens e mulheres. Mais parecia um capitão da areia, como nos contou o mestre Jorge Amado.

Jorginho, menino bom, corrompido pela vida e pelos homens, teve uma chance de mudar de vida. Andava à toa pelas ruas quando uma senhora deixou cair uma gorda carteira, provavelmente, cheia de dinheiro. Apanhou a carteira e ficou olhando, pensativo. A senhora, cheia de ouros e diamantes, aproximou-se: “Obrigada, meu filho”. Era a grande chance, poderia até ser adotado pela bondosa mulher e ter um lugar para chamar de lar. Virar um garoto normal, ir à escola. Foi rápido. “Brigado nada, tia. Vacilou!”. E saiu correndo com toda a rapidez possível, para aproveitar a, quem sabe, curta e perigosa vida...
=]

quinta-feira, janeiro 27, 2011

Duelo na praça

Ás vezes, algumas coisas acontecem comigo e eu quase não acredito que estejam realmente acontecendo. Fico meio perdido, imaginando se é mesmo real, se é alguma pegadinha ou mal entendido. Dia desses aconteceu mais uma dessas, de transitar entre o super surreal, imaginário, fantasioso. Parece até coisa de cronista muito do fantasioso...

Passava pelo coração da cidade de Fortaleza, a Praça do Ferreira, palco de vaia ao sol, da Banca do Bodinho, da Coluna da Hora, do Cine São Luís e de tantas outras construções históricas importantes, assim como espaço genuíno de molecagens cearenses. Como o sol castigava, procurei um abrigo e fui chegando perto de uma tenda montada por ali. Algumas poucas pessoas rodeavam alguém. Cheguei perto e dei de cara com um homem de viola em punho a jogar alguns versos para o ar. Um repentista.

Curioso e admirador do repente, cheguei mais perto para ver. Engraçado, para toda manifestação em praça, sempre tem gente para formar a platéia. Sempre me perguntava se esse pessoal não tinha outras coisas para fazer. Já que fui um deles, descobri: eles têm outras coisas para fazer, mas dá tempo de ajudar as manifestações populares e rir um pouco das presepadas dos outros.

Não havia mais de dez pessoas, na maioria, homens. Camisas sociais abertas, calças marrons e pretas, sapatos sociais ou chinelas, assim estavam alguns deles. Assim que me aproximei, o repentista, gaiato, mandou logo essa. “Minha gente querida/ a brincadeira vai começar/ chegou um caba famoso/e vocês podem reparar// É você mesmo, meu filho/ pela roupa é um crente/ vocês não acham, pessoal/ ele a cara do Tom Hanks?”.

Eu fiquei meio no ar nessa hora. Não sei o que meio veio à cabeça primeiro. Transitei entre dois pensamentos: “Que porcaria é essa?” e “que rima é essa de crente com Tom Hanks?”. Não satisfeito e reparando todos a olhar em minha direção, arrematou: “É você mesmo, querido/ não se faça de abestado/ você agora é mais um/ a provar do meu rimado”.

Sorri, pensando: “Isso lá é jeito de fazer repente?”. Não lembro de ter visto repentista mais besta, sem graça e agressivo. Não sabe fazer repente sem avacalhar com os outros? Não sei por qual razão, respondi assim: “Meu querido repentista/ mais cuidado com a rima/ desse jeito que tu versa/ nenhum povo se anima”. As pessoas começaram a rir e ele se enfezou.

“Mas então, meu filho, diga/ como é que se faz uma rima/ é com essa cara de lombriga/ e com esse jeito de menina?”. E a viola no brem, brem, brem. E respondi: “Eu pensei com muito gosto/ se podia te ajudar/ mas com tanta agressividade/ eu assim não sei rimar// Ao que me parece deseja/ um duelo em plena praça/ dou-lhe tempo de correr/ e evitar a desgraça// A tua viola mal chora/ e a tua rima não cola/ vai embora enquanto é hora/ e vê se não mais me amola// Tem tanta coisa bonita/ pra colocar num repente/ vê se fala das mulheres/ ou da nossa bonita gente// Admiro o repente/ e também os repentistas/ mas não aturo é essa gente/ rimador oportunista//. E os cearenses genuínos fizeram: ieeei! A parte chata: quando eu falava a viola não fazia o brem, brem, brem. Triste isso.

Ele passou um tempo tocando, pensando, olhando pra mim com uma vontade de matar alguém. Aí cantou: “meu magrelo querido/ torto feito um berimbau/ as tuas rimas que são fracas/ faz favor não leve a mal// Vamos parar com a rima/ que tu tá apanhando feio/ acho que pra combinar com tua feiúra/ vê se olha prum ‘espeio’// O duelo tá acabado/ não preciso dizer quem venceu/ pra todo mundo tá provado/ que o melhor aqui sou eu//. E tome brem na viola.

Nesse momento, já havia um número maior de pessoas observando. Ele, com o peito estufado, disse que acabou, mas continuou tocando a viola para me provocar. Antes de sair, sorri e fiz um movimento de reverência para dizer: “Meu querido ‘rimador’/ eu gostei da sensatez/ pra acabar com o duelo/ mostrou toda a rapidez// Com certeza fui vencido/ e quem sabe humilhado/ todo o povo concorda/ em quem foi o derrotado// Antes de ir embora/ deixo um conselho de verdade/ aproveite bem a vida/ e não esqueça a humildade//. E fui embora, assobiando um velho repente do querido Patativa...
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