Traduzindo

sexta-feira, dezembro 13, 2013

Luz em um dia cinzento


Queria foco
queria também
que os carros parassem
as buzinas cessassem
e as pessoas reparassem

Mais fácil seria
se estivesse quieta, gelada
em uma galeria
Inauguração com data marcada
discursos de estudiosos
 até curadoria

Insistiu em nascer na rua
à vista de todos
e sem cobrar ingresso

Mais uns dias e vai embora
derrubam muro, constroem prédio
tudo em nome do progresso

Mais uns dias e ninguém lembra
da arte que não soube esperar
e se atirou em direção ao nosso olhar

Mais uns dias e ninguém lembra
que a cidade não precisa ser cinza
mas precisa ser nossa

E o beijo que ficou marcado
coloriu de Luz a manhã cinzenta
lembrou que mais amor é possível
e só não é quando ninguém tenta

=]

domingo, dezembro 01, 2013

Assim é o certo

Gosto assim:
Cabelos ao vento
Ar selvagem
Indomável

Gosto assim:
Como estão
Cachos descontrolados
Voando para todo lado

Gosto assim:
Nós dois
Juntinhos

Teus cachos
Meus cachos

Gosto é assim
Gostoso assim
Nós dois
Em um só

Espera,
Tô chegando

=]

terça-feira, outubro 08, 2013

Cafas, 23 anos, drogado e prostituído

- Arturzinho!
- Faaala, Cafas! O que é isso aí?

- Cara, vim devolver teu livro. “Eu, Christiane F., 13 anos drogada e prostituída”. Pense num livro doido. Bem legal mesmo.
- Rapaz, nem lembrava que tava contigo, já tinha dado era como perdido. Pensei que tu tinha adotado pra criar ó.

- Foi mal. Tinha guardado muito bem guardado. Até eu não estava encontrando...
- Tranquilo. Vou aproveitar e reler. É uma história muito triste, mas muito boa.

- Lembra uma história minha...
- O que?! Vai dizer que tu ficou drogado e prostituído com 13 anos? Deixa de ser mentiroso!

- Calma! Eu disse “lembra” e não “igual”. E nem renderia um livro. Talvez rendesse um post em um blog desses qualquer.
- Lá vem história... Como foi isso aí?

Não sei se tu lembra, mas naquele meu aniversário de 23 anos, nós todos combinamos de ir praquela ‘Festa do Avesso’. Os homens vestidos de mulher e o contrário também. Eu nem queria ir, mas tava todo mundo empolgado e aí não queria ficar de fora. Poderia render umas boas risadas.

Peguei um vestido vermelho emprestado e aluguei uma peruca loira numa loja de fantasias. Não usei salto porque não consegui nem sair do canto com eles. Batom e maquiagem foi tranquilo, mas ficava me imaginando o quão ridículo estava antes de sair de casa. Deveria estar horrível, sério mesmo. Olhei no espelho depois que minha irmã me aprontou e tomei um susto. Estava pior do que imaginava.

E isso fazia parte, né? Era só uma festa do avesso e não concurso. Combinei com um amigo de ir com ele. Esperaria na esquina lá de casa. Nada de mais. Ele ligou e disse que chegaria em 15 minutos, mas acabou demorando um pouco mais. E é nesse tempinho extra que a história acontece mesmo.

Tava lá na esquina, tranquilo, esperando a carona... Aí, parou um carrão perto de mim e eu até pensei: Será que ele trocou de carro? Fiquei só observando, escorado no poste. Era um rapaz. Assobiou e pediu que eu me aproximasse. Pensei: deve estar perdido, mas não era bem assim...

- Psiu, ei, loira, chega aí.
- Opa, tá perdido, cara?

- Seguinte, quanto é?
- Quanto é o que?

- A parada?
- De ônibus?

- Deixa de graça. Tem cinquentinha aqui. Dá quanto?
- Cara, deve ser engano, eu não vendo nada não.

- Deixa de graça, loira. Nos falamos hoje cedo. Tava tudo acertado.
- Cara, tô dizendo, tu deve estar enganado...

- Tá tirando uma com a minha cara, né? Já sei, tá querendo aumentar o preço da parada é?
- Já te disse, não vendo nada. E sou homem. Deixa eu tirar a peruca aqui...

Mas a desgraçada da peruca não queria sair. Tava muito apertada e eu fiquei com medo de puxar de uma vez.

- Tá doidona já, lôra? Deixa de graça. Passa logo a parada que eu tô precisando muito hoje.
- Cara, já te disse. Não vendo nada e nunca te vi mais gordo...

- Puta merda, tem gente chegando aí. Isso não vai ficar barato pra ti, lôra. Vou te queimar pra rapaziada!

E foi embora.

Vinha chegando mesmo um outro carro e cheguei a pensar que era meu amigo. Não era. Outro carrão, mas dessa vez o motorista era um senhor de idade.

- Boa noite, moça
- Moça? Eu sou homem, cara!

- Eu sei, eu sei. Mas vamos deixar de detalhes e ir direto ao assunto: quanto?
- Quanto o quê? Eu não vendo droga, tá entendendo? Eu não vendo nada ilegal não.

- Ah, minha filha, você sabe o que eu quero. É só dizer quanto é. Quer entrar logo no carro enquanto conversamos?

Nessa hora, não deu pra segurar, a raiva foi grande. Falei todos os palavrões conhecidos e até inventei alguns. Um carro da polícia vinha passando e o velhinho se assustou e foi embora. Os policiais deram a volta no quarteirão e vieram perguntar se tava tudo bem comigo.

- Policiais, é o seguinte. Esse bairro tá muito perigoso. Um cara perguntou se eu vendia droga, e eu não vendo, viu? Outro, perguntou se eu fazia programa, e eu não faço, hein?

Descrevi os dois, novo e velho, e os respectivos carros. E eles ficaram olhando pra mim meio desconfiados enquanto eu falava nos perigos da cidade e no aumento da prostituição na área.

- Já pensou? O rapaz já deveria estar um pouco alterado mesmo, mas o coroa? Eu feio e desarrumado desse jeito e ele ainda vem perguntar se eu faço programa?

E um dos policiais falou:

- Também, com essas perninhas...

...

=\

terça-feira, setembro 17, 2013

Eu, as pedras e o lago - Sem vioência

De volta ao normal, talvez, andei rabiscando uns versos há um tempo.

"Vai ficar assim. Depois eu volto pra melhorar".

Bem, não consegui, mas vai assim mesmo.

Depois eu volto com algo mais trabalhado - o que não quer dizer "de mais qualidade" =D.

Beijos e abraços

=]

Eu, as pedras e o lago - Sem violência

Joguei a primeira pedra
No lago
Ele formou ondas
E nada mais

Joguei a segunda
Novas ondas
E nada mais

Esperei pelo grito
"sem vi-o-lên-ciá"
"sem vi-o-lên-ciá"

Mas nada aconteceu

Joguei a terceira pedra
Ele a recebeu
E ficou por isso mesmo

No fim das contas
O lago ganhou

Umas pedradas...

=]

terça-feira, agosto 27, 2013

Seis anos de viagens!

E já estamos em nosso sexto aniversário!

Como o tempo voa!

Eu passei o mês inteiro sem colocar nada de novo por aqui, não sei se alguém reparou, mas não foi sem motivo. Acho que passei pelo maior período de bloqueio criativo de todos os tempos. Ou foi a preguiça? 

Talvez, talvez, um pouco de cada.

O aniversário do blog foi no dia 13 e desde lá eu fiquei pensando no que ia escrever hoje. E não consegui, apesar de ter tentado de verdade.

Pensei em colocar uns versos ou uma crônica nova, mas não deu, nada de novo surgiu.

Pensei também em colocar algum dos antigos por aqui, mas achei melhor não.

Achei melhor vir aqui e fazer o de sempre: agradecer.

Agradeço de coração.

Agradeço ao meu amor e aos meus amigos. Agradeço também aos desconhecidos, que vez por outra aparecem por aqui.

Pensei em parar com o blog, dar um tempo. Talvez fosse bom.

Pensei melhor.

Não vou parar.

Vou continuar “perturbando” vocês com minhas tentativas de crônicas, poesias e até repentes.

Posso nunca ser um bom cronista, poeta ou repentista, mas e daí?

Vou fazendo por gostar de escrever, de inventar, de transformar, de “VIAJAR”, de misturar e, principalmente, de dividir.

Vamos em frente.

E parabéns pro blog!! – E um pouquinho pra mim também ^^ (não pela qualidade, mas pela insistência mesmo)!

Beijos e abraços !


=]

terça-feira, julho 30, 2013

O sanfoneiro

Foi-se embora o sanfoneiro
Perdemos um sonhador
Em cada nota uma viagem
Do palco ao interior

Em cada nota um verso
De pura lamentação
Dependendo da batida
Fazia chorar o coração

E se as notas mudassem
Não tinha mais quem chorasse
Fazia brotar novos sorrisos
E murmurar velhas canções
Era riso até no olhar
Tinha fogo em suas mãos
Dedos ágeis e espertos
Derretedor de corações

Poesia música líquida
Versos escritos no ar
A sanfona, atrevida
Nos deixava a sonhar

“Sanfoneiro, caba bom,
vem aqui, me faz favor,
solte um baião bem ardido
solta logo o forrozão!
Já tomei minha cachaça
e também a minha bença
tô caçando o cangote
daquela linda morena

Sanfoneiro, seu dotô,
faz o mundo ganhar cor
solta o riso e a dança
as conversa ao pé de ouvido
e os xamego de amor
Deixa chorar a sanfona
esquenta esse salão
manda as agonias embora
que hoje não temos hora
e fraqueza também não”

Sanfoneiro, bom poeta
do sertão pro mundo todo
da terra subiu ao céu
em canção se transformou...
=]

PS: A intenção era fazer uma homenagem ao sanfoneiro (cantor, compositor e instrumentista) que partiu recentemente. Caso não tenha ficado boa, não precisa nem dizer que a culpa é minha e não do homenageado, certo?

Beijos e abraços

=]

segunda-feira, julho 08, 2013

"Lindo é o teu sorriso"

Adriana costumava ir ao Passeio Público sempre no fim do dia. Gostava de ver o céu ficar laranja, rosa e violeta até escurecer por completo. Dizia-se uma colecionadora de pôr do Sol, guardando todos somente na memória. No entanto, se formou, deixou o estágio e começou a trabalhar. A poesia diária dos livros e do céu precisou ficar apenas para os domingos, não mais no finalzinho do dia.

Agora, frequentava o local aos domingos pela manhã, antes do pessoal das apresentações musicais começar a chegar. Ficava lendo e de vez em quando dava uma olhada para o mar. O azul do mar encontrava o castanho dos olhos provocando suspiros, como se olhasse para um amor proibido. A pela muito branca fazia Adriana ir pouco à praia. Os cuidados com a tatuagem nas costas também a desencorajavam recentemente.

Nos domingos pela manhã o movimento era pouco. Algumas famílias com crianças, raros vendedores de lanche e idosos. Há mais ou menos um mês, um outro personagem surgiu. Um jovem, gordinho, de óculos e cabelos pretos começou a sentar no banco vizinho ao da Adriana. A distância não era nem de três metros entre um banco e outro. Ela ficava um pouco incomodada, mesmo ele não sentando no mesmo banco.

O jovem parecia levar vários livros diferentes a cada domingo, pois em alguns dias ele ria feito um louco e em outros ele ficava mudo, ou chorava discretamente. Nos últimos domingos ele levou livros de poesia e começou a declamar. Isso começou a irritar Adriana, mas ela não queria deixar aquele banquinho e aquela vista depois de tantos anos juntos. Decidiu relevar.

Adriana conhecia a maior parte dos poemas declamados. Camões, Pessoa, Vinícius, Drummond e tantos outros que foram devorados por ela quando mais nova. Versos que ela mesmo escrevia nas agendas escolares ou para alguns namoradinhos do colégio. Um dia ele chegou a declamar “Eu preciso dizer que te amo”, e ela teve vontade de ir lá falar com ele. Não foi. Teve medo quando ele escolheu alguns do Augusto dos Anjos. Chorou com Cecília Meireles e suspirou com a graça do velho Drummond.

Domingo passado o rapaz levou um caderno. Riscava, apagava, ficava encarando o papel. Declamava. Fazia uma careta de desaprovação. Adriana já não lia tanto, não conseguia se concentrar. Sentava de lado no banco e alternava entre o livro e o rapaz. Quando ele reparava nela, algo raro, ela endireitava-se e sentava-se olhando para o mar. Os poemas do rapaz eram medianos. Alguns de amor, outros sobre perder pessoas, cotidiano, mar, estrelas, família. Alguns eram bem ruins mesmo, com rimas forçadas ou versos sem graça.

Ela tinha vontade de chegar no rapaz para conversar. Poderiam falar sobre literatura, vida dos poetas, métricas, escolas literárias ou sobre esse estranho ser a jogar versos para o ar todos os domingos pela manhã. Domingo passado ela soltou um pequeno riso de um verso com uma rima forçada. Ele começou a escrever no caderninho, se levantou e foi embora.

Mais um domingo chegou e Adriana dirigiu-se ao local. Nada do jovem chegar. Poderia ter se ofendido? Depois de um certo atraso, ele chegou. Bermuda jeans, camiseta branca e o caderninho. Ela não conseguiu disfarçar o sorriso, no mesmo instante em que ele olhou enquanto chegava. Ele sentou e ficou parado, feito uma estátua. Não estava escrevendo. Estava apenas a olhar o mar. Ela estranhou bastante, pois ele costumava passar muito tempo declamando ou escrevendo.

Ela tentou ler mais um pouco, mas estava inquieta. Talvez ele estivesse ofendido, deveria pedir desculpas? Ou não devia nada para ninguém e não se importava com ele? Não estava mais lendo, estava apenas a olhar para o livro. Voltou a olhar o mar. Então, escutou:

"À moça, ao mar

Melhor que olhar para o mar
É do banco levantar
Dar uma chance ao poeta
E talvez se apaixonar"

Foi um poema tão bobo, tão simples, que fez a moça sorrir. E ela fechou o livro e foi em direção ao rapaz, que sorria. “Que poema mais lindo!”, ela disse. E ele respondeu: Lindo é o teu sorriso, que deixa sem palavras até mesmo o mais falante poeta.

=]

quarta-feira, junho 12, 2013

Versos bonitos

Os meus mais bonitos versos
Nunca eu esquecerei

Ainda vai aparecer um ou outro
Quem nem mesmo sei quem são
Daquele tipo bem rancoroso
Dizendo “pura falta de imaginação”

Outros poucos, quem sabe
Um dia ainda dirão
“Eita poema mais bonito
Bem podia ser uma canção”

Meu amor, sua linda
Eis meus versos, vem cá ver:
“Essa vida só é bonita
porque estou com você”

Os meus versos mais bonitos
Nunca eu vou esquecer
Ainda que sejam bonitos
Não se comparam a você

Nos meus versos mais bonitos
Faltou contar uma parte:
Tu és joia preciosa
Um diamante de verdade

Com esse humilde poema
Espero fazer bonito
Que faça jus à tua beleza
E ao brilho do teu sorriso

Pra encerrar a conversa
Preciso dizer-te a verdade:
A oferecer só tenho meus versos
E amor pra eternidade

=]

domingo, junho 09, 2013

O charme do Cafas

Arturzinho estava feliz. Muito. Depois de algumas semanas de muita conversa via Skype, conseguiu convencer Adriana a ir ao cinema com ele. Ela era baixinha, branquinha e de cabelo castanho claro. Tinham se conhecido no aniversário de uma amiga em comum. Conversaram rapidamente, sem muita empolgação por parte dela. No dia seguinte, ele a adicionou no Facebook e as conversas foram evoluindo, até chegar o cinema. Tudo isso em menos de duas semanas.

Foram ver um dos filmes mais recentes do 007, com aquele ator loiro, baixinho e forte. Quando no meio de uma cena do agente secreto com uma bonita modelo, Arturzinho puxou conversa para se aproximar ainda mais e tentar um beijo.

- Esse novo 007 é feio, né?

Adriana nem olhou para ele. Ia comendo a pipoca despreocupada. Até começar a falar:

- Sabe que eu nem acho? Assim, o outro era muito mais bonitão, mas, sei lá, não acho esse aí tão feio não. Ele tem um charme, é diferente.
- Charme? Sério? Não consigo ver de forma alguma. E olha que eu não tenho problema em dizer se um homem é bonito ou não. Se eu achar, digo mesmo.

- Mas ele não é bonito. É charmoso, uma coisa muito subjetiva mesmo, talvez mais que a beleza. E com charme, olha, não dá pra competir.
- Tenho um amigo que sempre fala mais ou menos isso: “não preciso de beleza pra conquistar ninguém”. Aquele cafajeste.

- Ah, mas cafajeste com charme é um perigo. Tem muita mulher que gosta. Eu já tive um em minha vida, mas não é bom ficar contando essas coisas, né? Ainda mais no meio do filme.
- Não, sem problemas, pode falar. Essa parte do filme tá meio chata mesmo.

- Não vou contar o nome dele, tá? Eu o conheci num aniversário também. Aniversário da Renatinha, tua amiga também.
- Renatinha, gente boa.

- Pois é, por isso até demorei a aceitar o teu convite pra hoje, pois andei pensando que dá azar conhecer homem em aniversário das amigas! Olha que cabeça a minha. Sim, depois do parabéns, coincidentemente, eu esbarrei nele, na figura. Ele pediu desculpas, perguntou se tava tudo bem, se eu queria alguma coisa, muito solícito. Disse que era desastrado mesmo e tava até pensando em ir embora, de tanta vergonha que tinha ficado!

Falei do exagero dele e começamos a conversar. Ele não era bonito, nem feio, normal até. Nem gordo, meio magro. Nem dei muita moral no começo. O negócio é que ele era bom de conversa. Perguntou várias coisas, escutou minhas longas respostas e me olhava tão concentrado, focado em mim mesmo... Começou a contar um pouco dele, com uma paixão tão grande e um brilho nos olhos incrível! De vez em quando ele falava alguma besteira, eu ria, e ele soltava um sorriso muito bonito, de apaixonar.

Enquanto íamos conversando, empolgados, depois de quase uma hora de conversa, não sei como, mas estávamos cada vez mais próximos. Pois se no começo ele tocava meu braço, passou para a mão, pegou na cintura e já estava pegando em meus cabelos de vez em quando.

Aí, ele disse assim, como quem não quer nada: “Música alta, né? Vamos mais pra lá?”, e fomos. E não adianta ir pensando: “ah, como ela é inocente, parece uma serpente sendo hipnotizada”. Não. Nada disso. Na verdade, eu tava querendo que ele chamasse mesmo, já tava doida pra dar um beijo nele.

No lugar mais afastado foi que eu reparei como ele era charmoso. E o mais engraçado, ele não soltou nenhuma indireta ou direta pra mim. Nada, nenhuma mesmo. Tanto que eu tava com dúvidas se ele ia querer alguma coisa mesmo, se tinha namorada, se era gay ou só queria conversar mesmo.

Daí, “do nada”, no meio de alguma frase que não lembro agora, começamos a nos beijar. Foi uma noite muito bacana, muito boa mesmo. Depois, ficamos amigos e ficávamos até um tempo desses, quando achei melhor parar. Mesmo ele não prometendo nada, rola um sentimento e a amizade vai pro espaço! E... nossa! Eu a-do-ro essa trilha, essa musiquinha do 007, fico toda arrepiada.

- Olha, essa tua descrição parece tanto com um amigo meu... Tenho até medo de perguntar o nome dele...

- O nome dele? Não queria dizer não, porque é teu amigo, vi no teu face. Quer mesmo saber?
- Só pode ser o sem vergonha do Cafas...

- Cafas? Não, não conheço. É o Pedrinho. Não vale nada, mas é gente boa!

E Arturzinho passou o resto do filme calado...

=]

sexta-feira, maio 17, 2013

Crônica sem mensagem


Era sexta-feira à noite. Não sei ao certo o horário, pois saí do trabalho no horário de sempre, demorei muito para chegar ao terminal de ônibus e já esperava na fila fazia algum tempo. Dava pra ver muita gente voltando do trabalho, indo e voltando para aula e também já indo para alguma festa. Estava cansado, confesso, e tudo que mais queria na vida era a chegada do ônibus para poder ir para casa, tomar um banho, jantar e dormir.

Os vendedores passavam a todo instante, oferecendo doces, pipocas e outros itens para enganar a fome. Não aceitei nada. Só queria o ônibus. As pessoas reclamavam da demora de vez em quando. Não fiz coro, apenas fiquei observando e aguardando. Era mais uma noite no Terminal da Parangaba, esperando, esperando e esperando.

Estava no meio da fila, escorado numa das placas, olhando pro tempo e vendo o nada acontecer. Duas senhoras, à minha frente, conversavam em voz baixa, olhando torto em várias direções. Atrás de mim, um gordinho escutava música em alto volume. Tão alto que dava para escutar claramente, mesmo ele usando fones de ouvido. Ao lado, estudantes brincavam entre si.

Uma senhora brigava com o filho, mandando-o tirar o dedo do nariz. Um senhor escutava um programa esportivo em seu rádio e uma mulher pisava impacientemente no chão, querendo demonstrar seu descontentamento com o atraso do coletivo. Dois jovens tentavam flertar com uma loirinha, que não dava bola. Duas jovens, com roupa de academia, conversavam sobre as festas do sábado. Outras duas combinavam uma praia no domingo. Personagens diversos, iguais apenas na hora de reclamar.

Em um banco, ao lado das filas, um senhor estava deitado e parece ter acordado com a brincadeira dos estudantes. Começou a cantar. “Eu nasci há muitos anos atrás. E conheço essa bodega toda, pra frente e pra trás”. E fazia a primeira voz, mais grave, e a segunda, mais fina. “Eu nasci (voz grossa), eu nasci-iê-iê (voz fina)...”. Quem não estava horrorizado com a cantoria repentina, começou a rir disfarçadamente. Ele parou de cantar e olhou para fila.

“Aê, pivetada, tempo bom é esse aí, viu? Muita saudade da minha época de Liceu e cachacinha na Volta da Jurema”. Os estudantes começaram a rir, mas não comentaram nada. O senhor parecia um Raul Seixas mais gordinho, com uma camisa aberta até metade da barriga. As duas senhoras começaram a cochichar e a balançar a cabeça negativamente. O senhor não gostou.

“Minhas patroas, não gostaram de mim não, é? O que eu fiz pra vocês? Tão com inveja da minha liberdade, né? Fiquem sabendo que o senhor também é meu pastor e nada me faltará. Ele vai me fazer respeitar todo mundo, até aquele que eu não gostar. Bebi umas mais cedo, mas não perdi o respeito por ninguém. Todo mundo é filho de Deus e merece o mesmo respeito. E digo mais: não digo é nada”.

Antes que uma discussão começasse, o ônibus chegou e todos subiram. O senhor, não sei se embriagado, um pouco louco ou irreverente mesmo, fez que ia subir também para pegar um lugar, mas parou repentinamente e começou a sambar e a cantar: “Isso aqui iô iô, é um pouquinho do meu Ceará iá iá”. Finalizou com um giro e uma reverência, enquanto os passageiros começavam a rir.

Fui pra casa pensando em escrever sobre o acontecido. A crônica teria uma mensagem sobre respeito ao próximo ou, talvez, a felicidade dos possíveis loucos, ou algo do tipo. Gostei da frase “o senhor também é meu pastor” e achei que ela merecia uma reflexão sobre religião ou religiosidade.

Ia pensando nisso quando puxei a cordinha e dei sinal para descer do ônibus. Umas das garotas falou assim: “Eita, com um homem desses eu não sairia de casa nem pra trabalhar”. O gordinho vinha descendo comigo e não sei se falaram isso para ele ou para mim. Não entendi também se era um elogio ou apenas gozação. No fim, tirou minha concentração, a ideia fugiu e não teremos uma crônica com uma mensagem bonita...
=]

quarta-feira, abril 24, 2013

Poema ao Amor para ser lido balançando na rede


Te amo
E esse amor
maior que o mundo
Cabe muito bem
em meu peito
E esse amor
melhor do mundo
Eu o coloco
em cada beijo
Que eu te dou,
Sempre
E vou te dar
A vida toda

Te amo,
E nem vou te dar
O mundo
Eu vou te dar,
Meu tudo,
Um universo
De carinho
E uma vida
Bem gostosa
Pra nós dois

Escuta, Amor,
Te amo,
E te direi isso
Mesmo em
Silêncio
...

=]

domingo, abril 21, 2013

Eu me declaro culpado


o teu sorriso tem a beleza triste de um pôr do sol
mas tu bem sabes: o pôr do sol é muito mais bonito
e naquele dia, quanto mais eu bebia
mais bonito eu me achava
e dançamos músicas e mais músicas
tantas músicas foram
que eu não lembro de nenhuma
mesmo tu gritando em meu ouvido
"é a nossa música, é a nossa música"
a cada novo acorde
se tivesse tocado a marcha fúnebre
ou o hino de Quixadá
pra mim não faria a mínima diferença

e o teu sorriso feito sol que já se pôs
ainda me faz a falta que eu não te digo
nem por cartas
ou por indiretas do facebook
e o teu cabelo liso e enrolado
que enroscava na minha rala barba
também não faz falta
pra ti

pois quase morro ao lembrar só do cheiro
o que dirá de ficar enrolando-o entre
meus dedos
que recusaram aquele anel de compromisso
porque eu não queria me prender a ti
por conta de um anel
e fugia, como se eu fosse o diabo
e tu, a cruz
eu dizia ser uma alma rebelde
mas de rebelde ela não tinha nada
era só mais uma dessas almas covardes
dessas que há aos montes por aí

e o tempo todo eu vivia a dizer
e o tempo todo eu vivia reclamar
da tua pose de sabe-tudo
pois sabia muito mais que eu
que não sei nada da vida
apenas reclamar
a minha suja boca reclamou tanto
de ti, da vida, dos outros
e esqueceu de reclamar de mim
de todas as minhas canalhices
e cachorradas, brabas

descobri, enfim, que fui muito sabotado
por um inimigo íntimo demais
próximo demais e perigoso demais
eu mesmo

e eu sabia o tempo todo
o tempo todo eu sabia
e ainda sei
que eu tanto sabotava nós dois
por ter medo de ser feliz
por medo de perder essa felicidade
e voltar à tristeza
que eu não suporto mais...
=]

sábado, abril 13, 2013

Dia da Poesia


- Então, hoje é o Dia Nacional da Poesia? É o nacional ou o internacional?
- Hum?...

- Ás vezes eu fico me perguntando de onde vem a poesia... Vem da vida ou do poeta?
- Eu sei de onde ela vem...

- É? E de onde é?
- A poesia vem dos teus lábios, com certeza. Vem dessa tua boca atrevida, linda, que me dá uma vontade louca de encher de beijos e mais beijos...

- Ah, fala sério!
- Eu falo e, infelizmente, só falo, mas se pudesse... Ah, se pudesse! Te agarrava pela nuca e cobriria teu pescoço de cheiros!

- Sério, não vem curtir comigo. Afasta aí. Tu, que escreve, acha que todo mundo é poeta?
- Todo mundo eu não sei, mas o teu corpo eu tenho certeza que é poesia pura. Fico perdido em pensamentos mil só de olhar nos teus olhos. E se começo a imaginar nós dois...

- Ei, vem cá, declama um poema pra mim? Por favor?
-“Eu quero é viver em paz, por favor me beija a boca, que louca, que louca...”

- Ah, safado! Mais isso aí é uma música do Djavan, não vale não! Eu quero um só pra mim!
- Beleza, lá pro fim do mês eu te envio.

- Nada de “lá pro fim do mês eu te envio”. Eu queria agora...
- Mas pra escrever poema eu preciso de um tempo pra pensar. Pra ir escrevendo, apagando, tentando melhorar. Precisa estar inspirado também. Ou então, invento de fazer às pressas e sai uma porcaria...

- Tem certeza que não dá pra fazer um agora?
- …

- Eu vou ficar bem quietinha, tá?
- …

- …
- …

- …
- Desculpa, não consigo. Não consigo mesmo!

- Ahh, e eu me achando aqui, crente que ia ser uma boa inspiração...
- Então, beija minha boca
e esquece do mundo
Prova meu beijo
que eu te levo ao céu
sem sair do chão
Beija minha boca agora
e esquece da gente,
e de todos ao redor.
Cola teu corpo
ao meu
e deixa os corações
baterem
forte,
como um só
Esquece as provas,
as dívidas,
o emprego,
o futuro
e os anéis de saturno

Beija,
com toda a vida,
com todo o amor,
que eu te beijo
o dobro
=]

- Nossa... que poema mais bonito! Lindo demais! É teu mesmo?
- Já foi meu. Não é mais. É teu, mas nunca mais vai escutar de novo. Não conseguirei lembrar dele depois pra escrever. E nem é um poema não...

- Isso não é um poema? O que é então? É uma música? Rap? Repente? Cordel?
- É só desejo. Bruto. E externado...
=]

quarta-feira, março 13, 2013

O recomeço


Quando Paulo abriu a porta, Clarissa já o esperava. Continuava linda. Cabelos pretos, fortes, como sempre foram. O perfil mostrava uma mulher bonita. Estava em frente à mesinha da sala, sentada no sofá. Bebia. Apesar de triste, parecia calma. Parecia mesmo era estar desapontada. Ao cruzar o olhar com o dela, ele não consegue deixar de sentir uma pequena tristeza.

Ela vira o rosto para olhar as fotografias do casal na estante. Esboça um triste sorriso.
- Então, só queria saber uma coisa: é definitivo?
- Sim, é definitivo.

- A culpa foi minha? Fiz alguma coisa de errado? Deixei faltar algo para você?
- Não, você não teve culpa de nada. Isso pode acontecer com qualquer um.

- Alguém mais está sabendo?
- Não, sempre fui muito discreto, você sabe.

- Sim, e como sei. Sempre gostei disso...

Calmamente, ela tira o anel de casamento e coloca em cima da mesa.

- Sabe, Paulo, nosso casamento foi um dos momentos mais felizes da minha vida.

Sorri e deixa uma lágrima cair.

- Foram ótimos estes últimos anos. Já estamos perto dos quarenta. Quarenta, Paulo! Como isso tudo estava tão longe quando você ia escondido lá para casa. Deus, faz tanto tempo assim?

Coloca um pouco mais de whisky no copo e acendeu um cigarro.

- Você sabe que eu tinha parado com as duas coisas, mas hoje é um dia especial. Sabe, admiro tua discrição, porque eu não desconfiei de nada. Homem, quando é pra fazer safadeza...
- Clarissa...

Ela se levanta de repente e atira o copo contra Paulo.
- O pior de tudo é que eu não consigo ficar com raiva de você, não consigo! E você é um cachorro, sem vergonha, traidor... Você não existe, Paulo. Como pôde fazer isso comigo?
- Desculpa te desapontar, Clarissa, mas foi mais forte do que eu...

- Homem é tudo igual mesmo, coisa mais triste. Casam prometendo fidelidade e amor e quando você vai ver, pá, uma facada pelas costas! Pensando bem, achei estranho quando você demorou demais naquele Reveillon. Foi pegar uma bebida e voltou meio desconfiado... Foi ali que começou?
- Clarissa, eu só vim aqui devolver a minha chave do apartamento. Peço perdão e espero que um dia nós possamos ser amigos. Já vou indo.

Ele caminha em direção à ela, mas ela o afastou com a mão, como se espantasse um mosquito.
- Olha, é melhor você ir logo embora. Fique sabendo que pra mim não tem mais volta. Não sou mulher de idas e vindas. Adeus.

Quando ele se prepara para sair, ela fala, de forma triste:
- Paulo? Boa sorte para vocês e manda um beijo pro Marcelo.
=]

segunda-feira, fevereiro 18, 2013

O sorriso e a moça

Moça, aonde você vai
com esse sorriso tão bonito?
Queres acabar comigo?

Você quer fazer meu mundo inteiro 
desabar por um segundo?

Com licença, mas preciso perguntar:
Acha mesmo que sorrindo desse jeito
não vai me conquistar?

Acha mesmo que esses olhos tão bonitos
e essa boca tão bem feita
não vão me torturar?

Acha mesmo que minhas noites
tão pacatas e sem graça
não lembrarão desse olhar?

Acredite, até tento disfarçar,
mas o brilho em meus olhos
sempre vai me entregar

Com licença, mas preciso te expulsar
com certeza vai me achar um louco
e é verdade, eu não posso discordar

O que eu não posso, moça,
é deixar de te olhar...
=]

quarta-feira, janeiro 09, 2013

O picolezeiro


A profissão do título é um neologismo. Até acho justo criar uma nomenclatura e valorizar uma profissão tão importante. Em nossa tórrida loura desposada do sol eles são fundamentais. Além do picolé (do passarinho ao famoso “de água da chuva”), o marujinho: uma iguaria dos mais diversos sabores para combater o calor, pois é preciso estar sempre bem hidratado.

Então, depois do momento gramático-social-saudável, vamos à história. Atualmente, estou com uma mania engordante e nada econômica após o almoço: comer um picolé. Sempre comprava na farmácia em frente ao trabalho até o dia no qual ele apareceu. O picolezeiro. Um senhor baixinho, com seus sessenta e tantos anos, sempre a usar um boné para aplacar a quentura. A pela é bem bronzeada, castigada pelo sol.

Tenho companhias variadas durante o almoço e uma companhia certa após ele: o picolezeiro. Conversamos sempre sentados debaixo de dois palmos de sombra na frente da empresa. Fiquei imaginando a história de vida daquele senhor ainda cheio de energia, mesmo dizendo já estar bem cansado de tantas andanças.

Antes mesmo dele começar a contar, já tinha visto tudo: com certeza, era um ex-militar, cheio de mulheres e vazio de amor verdadeiro. Deve ter servido em algum lugar distante, como florestas ou serras e deve ter passado fome e sede para mostrar ser merecedor da farda. Após as desilusões amorosas, se entregou à bebida e hoje o picolé e o marujinho são os companheiros na luta pela sobrevivência.

- Meu filho, nasci aqui pertinho, num vilarejo que nem nome tinha na época. Trabalhei na roça e depois eu vim aqui pra Fortaleza. Passei muito tempo trabalhando em construção, muito tempo mesmo. Levantei prédio e casa em tudo quanto é bairro por aqui. Se duvidar, não sei onde cê mora, mas eu devo ter construído também.

Parou um pouco, tirou o boné para limpar o suor e disse um “volto já” para atender outro cliente. Quando voltou, o assunto era outro

- Já conheci muita gente nesse mundo, meu filho. Trabalhei muito tempo num shopping aqui, aquele lá dos mangues, da área verde, do dono do Ceará. É, aquele mesmo. Tinha muita gente rica ali e também muita gente besta. E eu não tenho nada contra os ricos não, até tenho uns conhecidos que são. Respeito, mas é porque tem uns tão bestas! Se duvidar, tão pensando que vão levar o dinheiro pro céu.

- Olhe, e era bom lá. Saí de besta. De besta não, pela monotonia. Mesmo eles pagando direitinho eu tive vontade de sair. Com o dinheirinho, levantei uma casinha melhor pra mim. Trabalhei também como segurança, mas também era muito chato. Reclamei tanto e virei vendedor de picolé. Tá com uns nove anos já. Andava daqui lá pro shopping. É chão, né? Eu sei. Andei demais debaixo desse sol desgraçado e tomei muito banho de chuva também. Meus meninos não querem que eu saia mais não. Eu tô muito cansado, mas vou ficar em casa fazendo nada? Só aperreando a mulher? Eu mesmo não.

Então, ficou olhando pro nada, olhando o tempo passar. Quando levantei para voltar ao trabalho, ele me perguntou a profissão e eu disse “jornalista”.

- Jornalista? Aquele pessoal que só gosta de fofoca? De falar da vida dos outros? Meu filho, deixe disso. Cada um vive a sua vida.
- Mas eu não sou do pessoal da fofoca não. Sou do pessoal da ciência.

- Ah... Se você tá dizendo...
- Irmão, vou escrever sobre você no meu blog. O senhor deixa?

- No seu quê? Bógui? Que conversa feia é essa?
- É tipo um site, é na internet.

- Ah, tá. Vai contar a minha história?
- Vou sim, gostei dela.

- E vai contar que eu vendo picolé?
- Vou sim, com certeza

- E muita gente vai ler?
- Pode ser, talvez. Não posso garantir.

- Pois, meu filho, aproveite e me ajude. Mande um feliz ano novo pra todo mundo e diga que eu tô por aqui sempre no horário do almoço, tá certo?

=]