Traduzindo

terça-feira, outubro 08, 2013

Cafas, 23 anos, drogado e prostituído

- Arturzinho!
- Faaala, Cafas! O que é isso aí?

- Cara, vim devolver teu livro. “Eu, Christiane F., 13 anos drogada e prostituída”. Pense num livro doido. Bem legal mesmo.
- Rapaz, nem lembrava que tava contigo, já tinha dado era como perdido. Pensei que tu tinha adotado pra criar ó.

- Foi mal. Tinha guardado muito bem guardado. Até eu não estava encontrando...
- Tranquilo. Vou aproveitar e reler. É uma história muito triste, mas muito boa.

- Lembra uma história minha...
- O que?! Vai dizer que tu ficou drogado e prostituído com 13 anos? Deixa de ser mentiroso!

- Calma! Eu disse “lembra” e não “igual”. E nem renderia um livro. Talvez rendesse um post em um blog desses qualquer.
- Lá vem história... Como foi isso aí?

Não sei se tu lembra, mas naquele meu aniversário de 23 anos, nós todos combinamos de ir praquela ‘Festa do Avesso’. Os homens vestidos de mulher e o contrário também. Eu nem queria ir, mas tava todo mundo empolgado e aí não queria ficar de fora. Poderia render umas boas risadas.

Peguei um vestido vermelho emprestado e aluguei uma peruca loira numa loja de fantasias. Não usei salto porque não consegui nem sair do canto com eles. Batom e maquiagem foi tranquilo, mas ficava me imaginando o quão ridículo estava antes de sair de casa. Deveria estar horrível, sério mesmo. Olhei no espelho depois que minha irmã me aprontou e tomei um susto. Estava pior do que imaginava.

E isso fazia parte, né? Era só uma festa do avesso e não concurso. Combinei com um amigo de ir com ele. Esperaria na esquina lá de casa. Nada de mais. Ele ligou e disse que chegaria em 15 minutos, mas acabou demorando um pouco mais. E é nesse tempinho extra que a história acontece mesmo.

Tava lá na esquina, tranquilo, esperando a carona... Aí, parou um carrão perto de mim e eu até pensei: Será que ele trocou de carro? Fiquei só observando, escorado no poste. Era um rapaz. Assobiou e pediu que eu me aproximasse. Pensei: deve estar perdido, mas não era bem assim...

- Psiu, ei, loira, chega aí.
- Opa, tá perdido, cara?

- Seguinte, quanto é?
- Quanto é o que?

- A parada?
- De ônibus?

- Deixa de graça. Tem cinquentinha aqui. Dá quanto?
- Cara, deve ser engano, eu não vendo nada não.

- Deixa de graça, loira. Nos falamos hoje cedo. Tava tudo acertado.
- Cara, tô dizendo, tu deve estar enganado...

- Tá tirando uma com a minha cara, né? Já sei, tá querendo aumentar o preço da parada é?
- Já te disse, não vendo nada. E sou homem. Deixa eu tirar a peruca aqui...

Mas a desgraçada da peruca não queria sair. Tava muito apertada e eu fiquei com medo de puxar de uma vez.

- Tá doidona já, lôra? Deixa de graça. Passa logo a parada que eu tô precisando muito hoje.
- Cara, já te disse. Não vendo nada e nunca te vi mais gordo...

- Puta merda, tem gente chegando aí. Isso não vai ficar barato pra ti, lôra. Vou te queimar pra rapaziada!

E foi embora.

Vinha chegando mesmo um outro carro e cheguei a pensar que era meu amigo. Não era. Outro carrão, mas dessa vez o motorista era um senhor de idade.

- Boa noite, moça
- Moça? Eu sou homem, cara!

- Eu sei, eu sei. Mas vamos deixar de detalhes e ir direto ao assunto: quanto?
- Quanto o quê? Eu não vendo droga, tá entendendo? Eu não vendo nada ilegal não.

- Ah, minha filha, você sabe o que eu quero. É só dizer quanto é. Quer entrar logo no carro enquanto conversamos?

Nessa hora, não deu pra segurar, a raiva foi grande. Falei todos os palavrões conhecidos e até inventei alguns. Um carro da polícia vinha passando e o velhinho se assustou e foi embora. Os policiais deram a volta no quarteirão e vieram perguntar se tava tudo bem comigo.

- Policiais, é o seguinte. Esse bairro tá muito perigoso. Um cara perguntou se eu vendia droga, e eu não vendo, viu? Outro, perguntou se eu fazia programa, e eu não faço, hein?

Descrevi os dois, novo e velho, e os respectivos carros. E eles ficaram olhando pra mim meio desconfiados enquanto eu falava nos perigos da cidade e no aumento da prostituição na área.

- Já pensou? O rapaz já deveria estar um pouco alterado mesmo, mas o coroa? Eu feio e desarrumado desse jeito e ele ainda vem perguntar se eu faço programa?

E um dos policiais falou:

- Também, com essas perninhas...

...

=\