Traduzindo

quarta-feira, outubro 29, 2014

O ódio que cega

De acordo com meu instituto de pesquisas, nunca antes na história desse país o nível de ódio nas pessoas e entre elas foi tão grande. A margem de erro existe, é claro, mas não souberam especificá-la. O nível de amor e respeito vai ser tema de outra pesquisa.

Não escuto mais alguém dizer “não gosto” ou “pra mim, não faz diferença”, só escuto o “odeio”. Qual é o motivo de tanta raiva, tanto ódio? E isso para assuntos banais até. “Odeio quem fala demais”; "odeio gordo"; “odeio gatos”; “odeio esse pessoal que oferece cartão”; “odeio atendente de telemarketing”; e por aí vai. Não gostar ou ser indiferente está fora de moda: o negócio é odiar.

Além disso, tudo é considerado um ato de guerra. Antigamente, era preciso espionar, invadir um território, fazer reféns ou algo do tipo. Há muitos anos, os atos de guerra são diferentes: vestir a camisa de um time; declarar opção sexual, declarar voto ou religião; preferência musical e literária; esbarrar; pisar no pé; espirrar e até olhar por mais de uns segundos para alguém (fora as loucuras no trânsito). Estamos todos em guerra contra todos e ninguém tinha me avisado nada!

Estamos vivendo o período “Ensaio sobre a cegueira” no Brasil. Todos estão ficando cegos por conta de tanto ódio. Somos todos inimigos uns dos outros atualmente. Declarados. Quando alguns começam a discutir política, futebol ou religião, a baba do ódio aparece. E escorre como uma cachoeira de esgoto.

Felizmente, ainda há esperança. Há quem promova o amor por aí, por meio de decisões políticas e principalmente por meio de atitudes cotidianas. Se não for o amor, é educação, cortesia, preocupação com o outro, gentileza ou algo do gênero, o que já é um ponto positivo. Discordar e discutir faz parte, é saudável, mas ser consumido pelo ódio é que não dá.

sábado, outubro 11, 2014

O amor e a dor de barriga

- Minha filha, o amor é que nem dor de barriga: dá e passa!

Tinha acabado de me acomodar em uma das cadeiras do ônibus da empresa. Duas senhoras conversavam animadamente, estando uma sentada na fileira da janela do lado esquerdo, à minha frente, e a outra sentada na fileira da janela do lado direito.

A frase foi dita para a filha, quando a jovem contou sobre o fim de um namoro. Pensei em interagir:

- E os dois também nos levam a fazer algumas cagadas...

Achei melhor ficar calado e não baixar o nível, piorando a conversa. Comecei a pensar no quanto aquela senhora deve ter sofrido. Alguém nasce assim, tão descrente no amor? Nascemos conhecendo o amor ou aprendemos ao longo da vida? Não sei, mas a senhora parecia extremamente descrente no tal sentimento.

Fiquei com pena, de verdade. Uma vida sem amor, olha, não desejo isso pra ninguém. Uma vida com dor de barriga, bem, eu até já desejei para algumas pessoas, mas foi só durante uma raiva, coisa rápida.

Estou aqui, escrevendo e vos importunando justamente por causa do amor. Não fosse ele, o que seria de mim? Não teria nascido e outras coisas mais. A lista é grande e não vou conseguir falar de tudo.

A dor de barriga e o amor não me parecem tão semelhantes. Em comum, já me fizeram agir com velocidade, mas por motivos distintos. Também já me fizeram passar noites em claro. A dupla tem na lista ter sido motivo para sair mais cedo do trabalho, embora também por razões distintas.

Eu não desejo pra ninguém uma dor de barriga ao acordar ou na hora de dormir, mas quem não merece um amor nessas horas, hein? O amor já me fez querer ser melhor, seja estudando, fazendo regime, aprendendo a dirigir ou fazendo coisas outras que a dor de barriga nunca ajudaria.

Enquanto pensava nisso tudo, a senhora à minha frente se ajeitava na cadeira. Colocou uns fones de ouvido e puxou um papel da bolsa. Era uma folha de papel ofício com um título grande, escrito à mão. Consegui ler de onde eu estava: Oração para proteger o seu amor.

Sorri.